sábado, 9 de março de 2013

Deputado pastor acusado de homofobia é 'um monstro', diz Xuxa


 
Publicado pelo Terra
 
A apresentadora Xuxa criticou nesta sexta-feira a eleição do deputado Pastor Marco Feliciano (PSC-SP) como presidente da Comissão de Diretos Humanos e Minorias da Câmara Federal. Xuxa disse em sua página no Facebook que leu sobre "esse 'pastor'" e que se impressionou com as declarações de Feliciano. O deputado causou indignação por declarações com teor homofóbico e preconceituoso contra negros em sua conta no Twitter.
 
"Gente!!!! Socorro! Vamos fazer alguma coisa! Esse deputado disse que negros, aidéticos e homossexuais não têm alma. Existem crianças com aids. Para este senhor, elas não têm alma?", questionou a apresentadora. "Todo mundo sabe o quanto eu respeito todas as religiões, mas esse homem não é um religioso, é um monstro. Em nome de Deus ele não pode ter poder", afirmou Xuxa.
 
"Esta pessoa não pode ser presidente da Comissão de Direitos Humanos. Ele não pode ter este espaço para usar, pisar e denegrir o ser humano", escreveu ela. Feliciano foi eleito presidente da comissão com os votos apenas de parlamentares da bancada evangélica - ele recebeu 11 dos 12 votos dos presentes, um a mais do que o mínimo necessário para ser eleito.
 
Bancada evangélica elege pastor presidente de comissão
 
O deputado disse que vai propor a criação de um minigrupo para debater "todos os assuntos de forma bem democrática". O pastor acrescentou que vai dar a resposta aos contrários ao seu nome trabalhando em defesa dos direitos humanos de todos os segmentos.
 
"O trabalho que vamos executar vai mostrar ao povo brasileiro que não sou homofóbico. Caso cometesse esse crime, teria que pedir perdão, primeiramente, à minha mãe, uma senhora de matiz negra", disse o parlamentar. "Quero lembrar que os direitos humanos são fundamentais. Sei o que é ser discriminado, sei o que se passa no nosso País", afirmou Feliciano.
 
O ex-presidente da comissão, deputado Domingos Dutra (PT-MA), disse que vai convocar a sociedade para protestar contra a eleição de Feliciano. O deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) informou que pretender ir ao Supremo Tribunal Federal para questionar a decisão. "A escolha partidária não pode se sobrepor ao desejo da sociedade", criticou ele.
 
Para viabilizar a eleição do deputado evangélico, o PSC teve o apoio do PMDB e do PSDB, que cederam suas vagas na comissão ao partido. Com apenas um membro no colegiado, durante a eleição, o PSC tinha cinco deputado membros. O PMDB cedeu duas vagas e o PSDB, mais duas. O partido também recebeu o apoio do PR, do PTC e de um deputado do PSB, o Pastor Eurico (PE).
 
A escolha do comando das comissões permanentes da Câmara é feita de acordo com o tamanho dos partidos na Casa. Conforme um coeficiente decidido pelas lideranças, os representantes dos partidos fazem as escolhas das comissão que irão comandar no próximo ano. Em 2013, coube ao PSC a 18ª escolha.
 

Homossexuais encontram dificuldades para se casar no civil em Minas Gerais


 
Publicado pelo Estado de Minas
 
Na contramão das deliberações de tribunais superiores, casais do mesmo sexo continuam sendo obrigados a recorrer ao Judiciário para se casar no civil em Minas Gerais. E, mesmo com a sentença favorável, alguns cartórios resistem a oficializar a união homossexual, como ocorreu com o primeiro casal a obter o parecer em Belo Horizonte, em setembro de 2012, depois de o Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, ter equiparado em outubro de 2011 os direitos e deveres em caso de heterossexuais e homossexuais.
 
Seis meses se passaram desde a cerimônia formal e as lésbicas I. e L. ainda não conseguiram retirar a certidão de casamento. “Os cartórios ainda não têm um procedimento único para acatar as decisões judiciais. Isso acarreta demora e por vezes inviabiliza a obtenção”, afirma a defensora pública Flávia Marcelle Torres Ferreira de Morais, especializada em direitos humanos coletivos e socioambientais de Minas Gerais. Ela prefere não revelar o nome do estabelecimento, com receio de prejudicar o processo.
 
Em outros estados a tendência tem sido diferente, como em São Paulo, cujo governo há duas semanas dispensou a ordem judicial como pré-requisito para efetivar o casamento civil de homossexuais. Na direção oposta, a Corregedoria-Geral de Justiça de Minas exige a permissão judicial. O parecer da corregedoria foi publicado em 24 de maio de 2012, em resposta a uma consulta feita pela Defensoria Pública. “Considerou-se que o relacionamento entre pessoas do mesmo sexo não tem previsão na lei de registro público e, portanto, não tem efeito legal”, explica Flávia.
 
A Defensoria Pública então passou a atender casais homossexuais que precisam ajuizar ação judicial para se casar e não têm como pagar os honorários de um advogado. O núcleo de Direitos Humanos Coletivos da Defensoria Pública está à frente de oito processos. Destes, dois já tiveram a sentença favorável publicada, e dois foram julgados de forma favorável em janeiro e em fevereiro. Na prática, porém, apenas um casal homossexual tem em mãos a certidão de casamento com a ajuda da defensoria.
 
Em 22 de janeiro, o técnico em informática Sérgio Rodrigues Lages dos Reis, de 21 anos, casou-se oficialmente com Gregory Rodrigues Lages dos Reis, de 21, que se proclama pastor da Igreja Inclusiva Manancial Missionária, culto evangélico voltado para a realização de casamentos gays no religioso. Os dois se casaram primeiro na igreja e posteriormente no cartório, em regime de comunhão parcial de bens. Adotaram o mesmo sobrenome. “Ficamos parecendo dois irmãos. Estou feliz porque agora posso dizer que sou parte da família do meu marido”, afirma Gregory, que teve a opção sexual rejeitada pelo pai. “Ele conversa comigo pelo telefone, mas nunca quis conhecer meu companheiro. Já minha mãe participou da cerimônia”, explica ele, que conheceu o parceiro há um ano: “Sou a favor de casar logo e constituir família, sendo fiel. Não concordo com a ideia de ficar protelando o casamento para viver com promiscuidade” .
 
“Gregory se casou rápido no cartório porque ele é persuasivo. Ameaçou chamar a polícia e só faltou rodar a baiana lá dentro”, diz uma fonte da área. Essa suposta resistência causa estranheza ao advogado Nilo Nogueira, diretor da Associação de Notários e Registradores do Estado de Minas Gerais (Anoreg-MG). “Se há autorização da Justiça, não há por que criar embaraços. O cartório não pode se recusar a cumprir ordem judicial e sequer a se negar a receber o pedido. O máximo que ele pode fazer é submeter o pedido ao juiz de Registro Público”, afirma.
 
EQUÍVOCO
 
Dono de cartório no Bairro Eldorado, em Contagem, Nogueira admite ter recebido três pedidos no último semestre e submetido o primeiro deles à Justiça, que o indeferiu. Sem entrar no mérito do conservadorismo da decisão, o diretor da Anoreg considera “equivocado” o parecer da corregedoria. “É uma tendência da Justiça brasileira. O próprio Supremo já considerou válida a união estável entre pessoas de mesmo sexo e a união estável se assemelha muito ao casamento. É natural que a gente venha a ter autorização para casamentos homossexuais, inclusive o STJ já autorizou a conversão da união estável homoafetiva em casamento na mesma linha do entendimento do STF”, compara.
 
MEMÓRIA
 
O primeiro casamento homossexual com registro civil em Minas Gerais foi realizado em março do ano passado em Manhuaçu, na Zona da Mata. Wanderson Carlos de Moura, de 34 anos, e Rodrigo Diniz Rebonato, de 18, foram autorizados pela Justiça local a oficializar a união. O ato abriu caminho para que outros relacionamentos fossem formalizados no estado. Wanderson e Rodrigo entraram com ação judicial invocando a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu a união estável entre pessoas do mesmo sexo. O juiz da comarca, Walteir José da Silva, acompanhou o posicionamento do STF, que considerou a união estável de pessoas do mesmo sexo como uma entidade familiar. Em 22 de fevereiro, o consultor de negócios Carlos Eduardo Chediack de Oliveira, 31 anos, e o analista de TI Jorge Chediack de Oliveira Miguel, 30, conseguiram autorização judicial para se unir no civil em Belo Horizonte, depois de sete anos de convivência, na primeira ação individual deste tipo movida por advogados na capital mineira.
 

domingo, 3 de março de 2013

Transexual pode se descobrir já na primeira infância, dizem especialistas


 
Publicado pelo G1
Por Luma D'Alama
 
A identificação com o sexo oposto e o eventual desejo de uma pessoa em assumir uma nova identidade de gênero começa geralmente na primeira infância, entre os 4 e 6 anos de idade, segundo o psicólogo clínico e psicanalista Rafael Cossi, autor do livro "Corpo em obra", lançado em 2011 após análise de seis biografias de transexuais.
 
Na última semana, o G1 publicou a história do menino americano Coy Mathis, de 6 anos, que se identifica como menina e é aceito pelos pais, mas tem tido problemas na escola ao querer usar o banheiro feminino. Segundo a família, Coy age assim e brinca com bonecas desde que tinha 1 ano e meio.
 
"Nessa idade, ainda não dá para falar se a criança será um transexual no futuro. Isso porque não se sabe até que ponto ela só está brincando de se comportar como alguém do outro sexo ou se esse já é um indício de transexualidade", diz.
 
Transexual é a pessoa que tem um transtorno mental e de comportamento sobre sua identidade de gênero, ou seja, nasce biologicamente com determinado sexo, mas se vê pertencente a outro e cogita fazer tratamentos hormonais e cirurgia para mudar o corpo físico. Ao contrário do que já acreditaram psicanalistas no passado, esse não é um caso de psicose, com alucinações e delírios, defende Cossi.
 
Brincadeira de criança – ou não
 
De acordo com o psiquiatra Alexandre Saadeh, coordenador do Ambulatório de Transtornos de Identidade de Gênero e Orientação Sexual do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (HC) em São Paulo, casos como esse sempre existiram, e é importante diferenciar uma simples brincadeira de um comportamento constante.
 
"É muito comum crianças inverterem os papéis, e quando é algo pontual não há maiores problemas. Mas, se isso se tornar um hábito frequente, diário, o menino querer mudar de nome, usar presilha e brinco, é indicado que os pais e o filho passem por uma avaliação profissional antes de qualquer coisa, para ver se essa é uma questão familiar que a criança está tentando resolver dessa forma ou se já é um transtorno de gênero", afirma.
 
O médico diz que cada caso precisa de um acompanhamento diferente e individualizado. Se houver realmente um transtorno, ser violento com a criança e censurá-la pode piorar muito a situação.
 
"A escola também não deve reprimir, mas chamar os pais, explicar o que está acontecendo e aproveitar essa oportunidade para educar também com as diferenças. E não é porque uma criança vê outra fazendo algo que vai querer imitá-la, elas não são macaquinhos", destaca Saadeh.
 
Na opinião do psicólogo Rafael Cossi, os pais têm que acompanhar o que está acontecendo e não adianta julgar, proibir, punir ou bater.
 
"Se houvesse uma mentalidade mais aberta e liberal dos pais, a escola aceitaria melhor. O medo do colégio é de como isso repercute para as famílias e a possibilidade de perder alunos de uma hora para a outra", diz.
 
Segundo Cossi, o preconceito da escola não é apenas contra transexuais e homossexuais, mas contra deficientes, pessoas com síndromes e tudo o que foge ao que é caracterizado "normal" – desde uma falta de uniforme até um cadarço ou cabelo colorido.
 
"Já os pais costumam dizer que ficam preocupados não tanto com o fato de o filho ser diferente, mas como será a vida dele em sociedade, se os colegas vão tirar sarro, pois existe muita discriminação", afirma.
 
Cossi cita o filme francês "Tomboy", de 2011, que conta a história da menina Laure, de 10 anos, que muda de cidade e se apresenta aos novos amigos como Mikhael. Até então, o fato de ela se vestir e se comportar como um menino não parecia incomodar a mãe, mas, quando ela fica sabendo que a criança "mudou" de nome, rejeita a situação.
 
Corpo x gênero O psiquiatra do HC Alexandre Saadeh explica que há um componente biológico muito importante na questão da identidade de gênero.
 
"Hoje em dia, sabe-se que existe um cérebro feminino e um masculino, determinado no útero da mãe por hormônios masculinos circulantes. E isso interfere no desenvolvimento cerebral para uma linhagem feminina ou masculina. A cultura e o ambiente também têm importância, mas a determinação é biológica", acredita o médico.
 
Segundo o psicólogo Rafael Cossi, a ideia de dimorfismo corporal entre homens e mulheres, ou seja, indivíduos da mesma espécie com características físicas (não sexuais) claramente diferentes, só ganhou força com os avanços da biologia no século 19.
 
"Até então, prevalecia a ideia de isomorfismo, em que o corpo feminino era visto apenas como uma versão do masculino. A vagina era considerada um pênis invertido e o calor era o diferencial dos corpos, pois a temperatura do homem era mais alta que a da mulher", afirma.
 
O psicólogo cita o livro "Inventando o Sexo – Corpo e gênero dos gregos a Freud", em que o historiador e sexólogo americano Thomas Laqueur estuda como o corpo foi encarado em vários momentos históricos. Cossi também destaca que desejo sexual, gênero e identidade sexual são conceitos bem distintos.
 
"Uma coisa é o desejo, a orientação, a prática sexual. Outra é o gênero, como a pessoa se vê, seus gostos e comportamentos – algo cultural, social, que varia com o tempo. Essa é a ideia do que um homem ou uma mulher faz, como pensa, como se veste, quais traços o definem. Já a identidade sexual envolve uma noção de inconsciente, inclui o fator psíquico, de como o sexo se constrói na mente e reconhece o que é homem e o que é mulher", esclarece.
 
É por isso que, segundo o psicólogo, existem transexuais lésbicas ou gays, ou seja, pessoas que se transformam fisicamente com cirurgia e hormônios, mas não necessariamente se atraem pelo sexo oposto.
 
"Nossa mentalidade ainda é muito heterossexual", ressalta.
 
"O filme é muito bom, é um relato, e não faz questão de dar nenhuma pista sobre qual vai ser o futuro da menina. Isso fica em aberto", aponta.
 
'Sofria muito por ser diferente'
 
A transexual Brunna Valin, de 38 anos, conta que desde os 7 anos já sabia muito bem que não gostava de meninas. Aos 11 anos, vieram as brigas no colégio, as surras dos meninos, até que ela deixou a escola na 7ª série do ensino fundamental.
 
"Eu sofria muito por ser diferente. Com 12 anos, já me apresentava como Brunna e me vestia de menina, com saia, sapato de salto, batom, brinco. Queria ser igual à Roberta Close, era um espelho", lembra.

Em casa, dentro de uma família religiosa, em São José do Rio Preto, no interior de São Paulo, a transexual também encontrou rejeição. Após apanhar algumas vezes, deixou os pais aos 14 anos e foi morar com a avó, depois com uma prima, até ficar sozinha.
 
"Tenho mais sete irmãos – dois homens e cinco mulheres. Só um irmão me aceita muito bem. No começo, para eles eu era gay, não entendiam essa questão de gênero. Meu pai morreu há três anos, ainda não aprovando", revela.
 
Brunna mora há dois anos na capital paulista, onde trabalha como orientadora sócio-educativa no Centro de Referência da Diversidade da ONG Grupo pela Vida, e visita a família apenas uma ou duas vezes por ano.
 
"No fim de 2012, fui lá passar o Ano Novo e contei que vou fazer a mudança de sexo. Percebi a rejeição no olhar, na fala deles. Ficaram perguntando se já consegui trocar de nome, se já está no RG. Enfrento isso todo dia, pois a sociedade nos vê como diferentes", diz.
 
A transexual, que foi profissional do sexo dos 14 aos 36 anos, voltou a estudar e agora está prestes a concluir o ensino fundamental. Este ano, pretende começar o médio e, depois, quer fazer faculdade de psicologia. No currículo, ela também acumula cursos de formação de costureira, cabeleireira e cozinheira.
 
Além disso, Brunna tem passado por um acompanhamento com vários profissionais no Ambulatório de Saúde Integral para Travestis e Transexuais do Centro de Referência e Treinamento DST/Aids, da Secretaria de Estado da Saúde. A meta é se submeter à cirurgia de mudança de sexo em 2014 – da qual não tem medo de se arrepender.
 
"Tomo hormônio desde os 15 anos, e hoje aplico uma injeção mensal à base de progesterona. Em maio do ano passado, coloquei silicone nos seios e agora estou tirando os pelos do corpo com laser. Já fiz no rosto e vou para os braços. Em agosto, também quero pôr prótese nos glúteos, porque as características femininas estão no corpo inteiro, não é só fazer uma vagina. Hoje nem gosto de olhar muito, aquilo não é meu", diz.
 
Dois anos de preparação
 
Antes de toda cirurgia para mudança de sexo, o Sistema Único de Saúde (SUS) exige que a pessoa, com mais de 21 anos, faça pelo menos dois anos de acompanhamento psicológico ou psiquiátrico, no qual seja diagnosticada com distúrbio de identidade de gênero.
 
No ambulatório de São Paulo, criado em 2009 e considerado o primeiro do tipo no país a atender exclusivamente travestis e transexuais, há atualmente 1.500 pessoas cadastradas. Desse total, 65% (975) se consideram transexuais – 915 são homens biologicamente que se sentem como mulheres e 60 são o contrário. Os outros 35% são travestis que desejam tomar hormônios e mudar a aparência, mas não pretendem fazer a operação.
 
"Esses dois anos de acompanhamento que oferecemos com psicoterapeuta, psiquiatra e endocrinologista servem para a pessoa ter certeza sobre a cirurgia. Aí fazemos o encaminhamento ao HC. Nesse período, alguns desistem. Outros vão para a Tailândia, mudam de sexo e se arrependem, porque lá não existe todo esse protocolo daqui", diz a diretora técnica substituta do ambulatório, Angela Peres.
 
Segundo ela, o local conta com uma equipe de 30 profissionais – entre clínicos gerais, endocrinologista, psiquiatra, psicólogos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, urologista, ginecologista, proctologista, assistentes sociais e recepcionistas – e atende brasileiros de vários estados, como Minas Gerais, Bahia e Acre.
 
Cirurgia, felicidade ou arrependimento
 
Em 14 anos, o HC de São Paulo já operou 50 pacientes para mudança de sexo, a maioria homem que se sente mulher, segundo o chefe de urologia pediátrica e disfunção sexual do hospital, Francisco Dénes.
 
"Nunca vi um caso de alguém que tenha se arrependido. Isso ocorre quando o paciente é mal orientado", ressalta.
 
Para trocar do sexo masculino para o feminino, em geral são feitos tratamento hormonal e uma única cirurgia de 4 horas. Já o inverso exige duas ou mais operações de cerca de 3 horas. Apesar de o primeiro caso, em que há a desconstrução do pênis e dos testículos para a formação de uma vagina, parecer mais tranquilo, o urologista diz que pode exigir retoques, ter mais problemas anatômicos, risco de infecção, abertura dos pontos ou necrose (morte do tecido).
 
O pós-operatório envolve o uso de curativos, sonda e pelo menos sete a dez dias de repouso no hospital. Se não houver problema, a pessoa pode voltar logo às atividade normais. E nos dois anos seguintes, pelo menos, deve fazer acompanhamento médico.
 
Em entrevista ao Fantástico, em janeiro, a transexual Lea T, filha do ex-jogador de futebol Toninho Cerezo, disse que se arrepende de ter feito a troca de sexo em março do ano passado e que não aconselha o procedimento para ninguém. Ela foi operada na Tailândia e passou um mês e meio no hospital sentindo dores.
 
"Eu achava que a minha felicidade era embasada na cirurgia. Fiquei mais à vontade, mas um pênis e uma vagina não trazem felicidade para ninguém. Nunca vou ser 100% mulher. Calço 42, minha mão é enorme, meu ombro é largo. Quando fiquei deitada na cama, entendi que isso tudo é uma bobeira. É um detalhe importante para a sociedade", disse na época.
 
Segundo o psicólogo Rafael Cossi, ver a cirurgia como forma de "normalização" social, para se adequar ao pensamento heterossexual, é uma das maiores críticas à mudança de sexo. Ele cita o site sexchangeregret.com, em que um grupo de transexuais arrependidos após a operação contesta a ideia de que a troca de sexo é o fim para todos os males.
 
"Muitas pessoas não ficam em paz consigo mesmas, não têm benefícios nem se veem de uma forma mais tranquila. Algumas desenvolvem problemas que não tinham antes, como alcoolismo ou dependência de drogas. Isso porque a cirurgia não altera só a imagem corporal para pertencer a outro sexo, mas tem várias complicações, pelo fato de o indivíduo passar a apresentar outro status na vida, um novo nome e ser visto de maneira diferente pela sociedade", explica.
 
Mas, por outro lado, tem gente que é muito beneficiada com a cirurgia, diz o psicólogo.
 
"É caso a caso. Para a (ex-BBB) Ariadna, por exemplo, pelo que ela deu de entrevista, foi algo muito bom", ressalta.
 
Desde 2008, o SUS já fez 2.451 cirurgias de mudança de sexo de homem para mulher, único grupo de pacientes atendido atualmente, pelo fato de o Ministério da Saúde considerar que são casos mais comuns (três homens para uma mulher), mais bem padronizados e aprovados pelos conselhos de medicina.