Tramita no Congresso Nacional a proposta de alteração do Código Penal
brasileiro, que entre outras coisas traz como novidade a criação dos
“crimes de preconceito e discriminação”, incluindo a homofobia. Para
saber mais sobre o assunto, o MixBrasil conversou com Luiza Nagib Eluf,
procuradora do Ministério Público de São Paulo especializada na área
criminal que integrou a equipe de 15 juristas responsáveis pela revisão
do código. Confira:
Na Comissão de Juristas para propor o Anteprojeto de Código Penal havia três mulheres. Isso é uma conquista?
Começamos com três mulheres, mas logo uma delas pediu para sair. Ficamos
com duas mulheres, mas no meio de 16 pessoas, acho que é pouco. Avanço
mesmo seria termos metade para cada gênero.
Quais foram as principais alterações propostas que envolvem o segmento LGBT?
Criamos os crimes de preconceito e discriminação de qualquer natureza,
incluídos os preconceitos com relação à orientação sexual. Também
incluímos como agravante do homicídio o assassinato de pessoas por
intolerância quanto à orientação sexual ou identidade de gênero. Na
mesma agravante incluem-se os crimes praticados por preconceito de
outras naturezas como raça, gênero, etnia, condição de vulnerabilidade
social, religião, origem etc. São os chamados crimes de intolerância ,
crimes de ódio contra parcelas imensas da população.
Houve resistência de algum membro da Comissão em relação à garantia dos direitos LGBT?
Não, os membros da Comissão votaram pela incriminação do preconceito por unanimidade.
O que a levou a defender esse segmento?
O que me levou a defender esse segmento é o fato de todas as pessoas
merecerem respeito! É injustificável que certas pessoas se arvorem no
direito de agredir, machucar e até matar por ódio ao comportamento
sexual alheio. O que duas (ou mais) pessoas fazem entre quatro paredes
não prejudica terceiros. A interferência na intimidade alheia é vedada
pela Constituição Federal, que protege a privacidade, a honra e o sigilo
das comunicações. No entanto, apesar de todas as garantias cidadãs, os
preconceitos proliferam e se manifestam das mais variadas formas. A
intolerância à homossexualidade tem levado ao homicídio de gays
assumidos, além de numerosas outras formas de agressão física,
psicológica ou moral que não chegam ao assassinato, mas são igualmente
inadmissíveis. Para agravar a situação, há pregações desastrosas no
sentido de que a homossexualidade seria uma doença passível de
tratamento ou uma aberração a ser exterminada. E não se vê a ação do
Estado para coibir, de forma eficiente, esse tipo de manifestação
incompatível com nossa democracia. Mas quero lembrar que eu não defendo
apenas a comunidade LGBT. Defendo os direitos humanos e da cidadania de
toda a população. Ou seja, eu luto pela Justiça.
De que forma a defesa dos direitos LGBT articula-se com a defesa dos direitos das mulheres?
Os direitos das mulheres têm tudo a ver com os direitos da comunidade
LGBT, pois todos estão lutando contra a discriminação e a intolerância. A
única forma de prevenir os crimes de ódio é modificando a cultura
patriarcal intolerante, reprovando-se socialmente as formas
preconceituosas de tratar os outros e ensinando-se o respeito aos
direitos humanos e da cidadania.
No Brasil, os maiores avanços em relação aos direitos LGBT são feitos pelo Judiciário. Como você avalia esse cenário?
O Judiciário tem mesmo esse papel, de fazer justiça. Acredito que o
ideal seria o Congresso assegurar os direitos LGBT elaborando leis
específicas do interesse da comunidade, mas enquanto isso não acontece o
Judiciário está fazendo sua parte.