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Noto que há uma gente que realmente acredita que humor e militância não
combinam. O grande problema de parte da militância, e aqui quero falar especialmente
da militância LGBT, é essa fixação cartorial com o deboche e piadinhas de gay.
Quando o deputado Jean Wyllys diz no documentário “O Riso dos Outros” que
acha “engraçado como somente heterossexuais fazem piadas sobre gays”, mostra que,
além de não ter senso de humor, não é um bom observador. Eu mesmo só posso bocejar
de tédio de uma militância assim.
Todo esse papo é baseado no completo esquecimento de que o deboche é a base
firme do que se chama de humor gay. Daí a palavra gay para definir homossexual; a
bandeira ser colorida; as drags, plumadas e purpurinadas. Por mais que você tente mante
r a purpurina longe do homossexual, ela volta a ele por si mesma. A militância histérica
(que não é a maioria, mas a que grita mais) se acredita isenta de críticas e se esquece disso. O esquema de pensamento é dos mais fracos: se homofóbicos fazem piadas com gays, e
Fulano de Tal fez piada com gays, logo Fulano de Tal é homofóbico.
Claro, o ressentimento dos homossexuais, como o de outras minorias, é
inteiramente razoável: assustam-se com este mundo, porque este mundo é um lugar
mais assustador se você for gay. A homossexualidade ainda é ilegal em 81 países; em
boa parte deles os homossexuais são condenados à morte. É compreensível que alguns
não queiram brincar com isso. Mas uma vez que a reação a qualquer piada é a histeria,
só confirma aquilo que homofóbicos pensam: essa é uma gente doente. Quando
RuPaul é chamada de transfóbica por usar expressões como “shemale” e “tranny” em
seu programa, por exemplo, mesmo com todo seu histórico de militância, notamos
que há uma horda de gente doente à solta que não sabe mais distinguir o que é ofensa
e o que é piada.
Ainda acredito que o humor seja a melhor ferramenta para combater a homofobia. O
que o humor faz é mostrar que, se existe algo que se entende por mundo gay, ele é
alegre, vivo, não essa imagem triste que alguns querem colar.
Tome por exemplo o show de uma drag queen. Há uma força viva no palco, nas piadas
auto-depreciativas, sem medo do ridículo. E isso é muito bom. As imagens que ficam
depois de uma apresentação não são negativas, mas alegres. O humor renova a
saúde mental. Saber se debochar te põe acima do difamador. Há mais dignidade no
tombo de uma drag queen no palco do que nessas cartas abertas enviadas a humoristas.
Algumas pessoas se opõem a essa visão porque são ressentidas, porque sofreram abusos
ou porque não têm senso de humor. Por mais que eu entenda o ponto, não concordo
com essa postura de forma alguma. Gostaria de ver uma militância mais burlesca, que
saiba rir de si. É claro que aqueles que sofrem têm direito de se queixar. E devem se
queixar. Mas na medida em que perdem a cabeça por qualquer motivo, confirmam
as suspeitas dos homofóbicos: são doentes e tristes. E a tendência atual me parece ser
essa combinação repugnante, que pouco tem de gay. A homossexualidade não é
uma doença.
*Guy Franco - Nasceu em 1984, mora em São Paulo, de onde sai só para comer. Em
1999, pegou homossexualidade no metrô – aquele monte de gente junta, as janelas
fechadas. Já foi bancário, designer e videoartista. Em 2008 criou o blog coletivo
Canudos Coloridos. Foi colunista da revista 'Alfa' em 2012. Twitter (@guyfranco)
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