sábado, 16 de agosto de 2014

Cantora gospel americana revela que é gay e diz que Deus a ama do mesmo jeito


 
 
Visto em O GLOBO
 
Aos 35, Vicky Beeching contou nunca ter tido um relacionamento por conta do conflito              existencial em torno de sua sexualidade.
 
Fãs evangélicos da cantora gospel Vicky Beeching, de 35 anos, podem levar ao susto ao ler 
os   jornais nesta semana. Em entrevista ao periódico inglês "The Independent",
 Beeching declarou que é gay, e que mesmo assim, Deus a ama do jeito que ela é.
 
A artista é um dos maiores ícones dentro da Igreja Anglicana. Formada em Teologia 
em Oxford, na Inglaterra, Beeching também se popularizou ao comentar aspectos 
religiosos do dia a dia, conquistando hordas de fieis. Escrevendo canções gospel 
desde os 11 anos, a cantora já fechou contrato com duas gravadoras internacionais e
 vendeu milhões de discos no chamado “Cinturão da Bíblia” dos Estados Unidos.
 
Na entrevista, Beeching diz que foi criada por pais evangélicos conservadores. Na 
escola, livros diziam que a homossexualidade era pecado, “coisa do demônio”. Mas isso
 não foi o suficiente para que ela não começasse a se sentir atraída por outras meninas,
 ainda aos 12 anos:
 
- Perceber que eu estava atraída por elas foi uma sensação horrível. Eu estava 
tão envergonhada! Era uma luta, porque eu não podia contar a ninguém – confessou.
 
Ao se dar conta de sua homossexualidade, Beeching entrou em depressão, acreditando
 que estava pecando e que não poderia ser “curada”. Aos 13, ela chegou a pedir a Deus
 que ou tirasse a vida dela, ou a atração por outras meninas. Com 16, durante uma colônia de férias cristã no interior da Inglaterra, a cantora chegou a se submeter a uma sessão de exorcismo, em vão.
 
- Lembro de muitas pessoas colocando as mãos nos meus ombros, orando muito alto e, 
em seguida, gritando coisas tipo: 'Nós ordenamos que Satanás saia! Saia fora, corja
 de demônios! Nós falamos a vocês, demônios da homossexualidade: deixem a menina
 em paz!'.
 
Isso foi a gota d`água para Beeching, que se sentiu humilhada com a situação. Na entrevista,
 a cantora contou que o episódio serviu para que ela se tornasse mais introspectiva, 
buscando outras soluções por conta própria. Dedicou-se aos estudos, formando-se
 em Teologia em Oxford e seguindo logo depois para Nashville, no Tennessee, atraída
 pela carreira de compositora. Por lá, imersa no centro do conservadorismo 
evangélico americano, gravou discos e percorreu grandes igrejas do país para mostrar
 suas canções. 
 
Mas amores frustrados por amigas e outras mulheres a perseguiam como uma sombra.
 Nesse meio tempo, Beeching teria tentado até começar relacionamentos com homens,
 todos sem sucesso.
 
Em 2008, aos 29 anos, ela decidiu se mudar para a Califórnia, esperando que San 
Diego fornecesse um ambiente mais liberal. Mas este foi o ano em que a Proposição 8,
 lei estadual que proíbe o casamento homossexual, estava para ser votada. 
Em paralelo, Beeching cumpria sua série de shows agendados em igrejas do estado.
 
No início de 2014, a artista descobriu ter uma doença rara de pele, que deixava a 
epiderme com marcas de cicatriz, podendo levar até a morte. Durante uma 
sessão de quimioterapia, a cantora pensou consigo mesmo que deveria resolver sua 
situação pessoal. Ela já tinha 35 anos:
 
- Olhei para o meu braço com a agulha da quimioterapia, olhei para a minha vida, e 
pensei: 'tenho que entrar em acordo com quem eu sou' – afirmou Beeching na 
entrevista. - Trinta e cinco é metade de uma vida, e eu não posso perder a outra 
metade. Perdi tanta vida como uma sombra de uma pessoa.
 
Até então, Beeching nunca tinha mantido um relacionamento homossexual. O tratamento 
da doença a fez refletir e aceitar gradualmente sua homossexualidade. Na Páscoa, ela 
revelou aos seus pais a situação, que acabaram se desculpando por fazerem ela passar
 pelos constrangimentos. Beeching e eles concordaram em discordar sobre a teologia.
 
Ao final da entrevista, a cantora afirmou que espera agora que a Igreja Anglicana 
siga o exemplo acolha fieis homossexuais.
 
 

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Como é ter um pai gay? Filhos respondem




Publicado pelo iGay 

Mariana, Bryan e Dalila explicam como lidaram com a homossexualidade dos pais e com uma nova estrutura familiar


Há dez anos, a designer Mariana Ribeiro, 27, chamou o pai, o empresário Marco Antônio dos Santos, 56, para ter uma conversa. No papo, sem muita cerimônia, ela o convidou a sair do armário e se assumir gay. “Não precisa sentir vergonha, nós somos uma família, para que esconder?”, recorda Mariana, sobre o que disse na ocasião para Marco, que aceitou o convite da filha.

Mãe solteira, orgulhosa da sua família que foge do perfil tradicional, Mariana já sabia que o pai era gay há alguns anos, até pelo fato dele morar com outro homem. A designer conta que sempre foi muita apegada a Mauro e queria mostrar que estava ao lado dele.

“Eu me identifico muito com meu pai, sou a mais parecida com ele. Não só fisicamente, mas também emocionalmente. Mesmo vivendo longe um do outro, a ligação é muito forte”, conta Mariana, que mora em Cotia (SP), há 20 km de Marco, que vive na capital São Paulo.

Marco, que teve mais duas filhas com a ex-esposa, além de Mariana, demostra orgulho da cabeça aberta da filha. “Nós sempre criamos nossas filhas para o mundo”, observa. “Uma das melhores coisas de ser pai é nos ver refletido em nossos filhos, lembro até hoje quando a minha outra filha, com uns oito anos, me falou que eu ria pouco, desde então tento rir mais”, prossegue ele, casado há nove anos com o também empresário José Antônio, 56.

Aliás, José cobra do marido quando ele deixa de ligar para as filhas. Fã dos almoços de domingo em família, o padrasto gosta de receber a enteada Mariana e filho dela Caíque, 2, no apartamento em que mora com Marco.

“O que interessa não é o formato da família, mas as pessoas que a compõem. Eu não mudaria absolutamente nada na minha vida”, constata Mauro, sem conseguir conter a emoção. “Nós nos escolhemos, poderíamos ter nos negado não é mesmo?”, concorda José. “Se não fosse assim, não seria minha família”, arremata Mariana.

Renasci quando sai do armário

Diferentemente de Mariana, o estudante Bryan Asfora Coutinho, 21, ficou sabendo que o pai era gay quando ainda era criança, aos 8 anos. O fotógrafo Mau Carlos Correa Coutinho, 47, decidiu se assumir durante uma viagem com filho Bryan e um antigo namorado.

Mau e o filho Bryan: 'É difícil ver uma relação com tanto amor e carinho como a deles'

Com o apoio da ex-sogra e da mãe de Bryan, Mau fez a revelação e se surpreendeu com reação do filho. “Eu contei, ele começou a chorar, então entrei em pânico. Mas logo depois, ele me disse que estava preocupado porque iam me zoar”, conta o fotógrafo, emocionado.

Mau diz que a emoção de sair do armário para o filho só é comparável a que ele sentiu quando Bryan veio ao mundo. “Guardo com muito carinho dois momentos: O primeiro é o nascimento do Bryan. Depois, o meu renascimento, ao me assumir gay para ele”, revela o fotógrafo.

Depois de viver desde criança com a mãe, Bryan se mudou para casa do pai, que fica mais perto da faculdade de cinema que ele cursa, na Zona Sul do Rio de Janeiro. “Temos conflitos de quem vive junto, mas tenho muito carinho pelo meu pai. É uma relação como de qualquer outro pai e filho”, relata o estudante.

Quando ouve alguma provocação sobre a sexualidade do pai, Bryan se acanha em responder. “Se alguém faz manda uma indireta, eu respondo com uma direta. A pessoa percebe logo que está sendo desagradável”, explica.

Marido de Mau, o designer Matheus Madeira Queiroz, 28, fala com admiração da relação de cumplicidade do parceiro com o filho. “Eles falam que tem uma relação como qualquer pai e filho, mas não é verdade. É difícil ver uma relação com tanto amor e carinho como a deles”, exalta Matheus.

Tenho dois pais gays

A estilista Dalila Pedreira Viana, 25, se orgulha ter uma dupla paternidade gay. O pai biológico, o engenheiro Rafael Santa Viana, 55, tem o mesmo status familiar que o padrasto dela, Marcelo Lyra,51. “Eles resolvem tudo juntos. Me dou muito bem com Marcelo, eu gosto do que ele fala, do que ele pensa, o admiro”, elogia Dalila.

Dalila e o pai Rafael em um Carnaval que passaram juntos em Salvador

Aos 12 anos, sem saber que ele era o marido do pai, Dalila, que foi batizada na pré-adolescência, escolheu Marcelo para ser o seu padrinho. Um ano depois, ela descobriria que os dois formavam um casal, quando Rafael se assumiu.

“Chorei muito, nem sei por que. Depois, me dei contai que era por isso que eles dormiam no mesmo quarto desde sempre”, se diverte a estilista, lembrando-se da situação.

Hoje, Dalila vive em São Paulo, enquanto Rafael e Marcelo administram uma pousada no litoral baiano. “Falo com meu pai toda a semana, muito mais do que falo com qualquer outra pessoa que ficou na Bahia. Ele sabe tudo que acontece na minha vida, do trabalho aos namorados”, pontua a estilista, que só reclama de um impedimento causado pela distância. “Sinto muito falta de tomar uma cervejinha com eles”.

Veja direto no iGay

Advogado dá dicas do que falar e o que fazer quando um estabelecimento proibir o seu beijo gay



Por Neto Lucon para o site A CAPA
 
Não é de hoje que escutamos, vemos ou enfrentamos situações em que estabelecimentos comerciais proibem um beijo, um selinho ou gestos de carinho de casais formados por pessoas do mesmo sexo.
Recentemente, um casal gay foi agredido após trocar um beijo no restaurante Sukyia, da Rua Augusta. Outro foi proibido de dar um selinho no hipermercado Extra, no shopping Aricanduva, em São Paulo.
 
Pensando nisso, o A CAPA pediu para que o advogado Thales Coimbra, especialista em direito LGBT, desse dicas e alternativas para enfrentar o preconceito de seguranças, empresários (...) quando saímos em casal.
 
Thales afirma que o restaurante pode proibir determinados comportamentos dentro do espaço e que até tem o direito de selecionar a clientela - cobrando caro ou exigindo determinado traje - mas que não pode ter exigências discriminatórias com base em identidade de gênero e orientação sexual.
Ou seja: "Se o restaurante não quer beijo gay, também terá que coibir o beijo heterossexual, caso contrário incorrerá a discriminação".
 
- O que fazer se um segurança vier dizer que não posso dar um beijo no meu namorado, marido ou parceiro no estabelecimento?
 
- Peça para falar com o responsável por essa ordem. Nunca, em hipótese alguma, discuta com o segurança. Além de não resolver nada, você só vai esquentar sua cabeça, correndo o risco de ser agredido.
 
- Antes de falar com o gerente, procure documentar essa conversa, por meio de áudio e/ou vídeo, além de testemunhas - afinal, você também não quer ser agredido pelo gerente.
 
- Ao falar com o responsável, mencione seus direitos e diga que a exigência é ilegal. Caso ele insista, avise que você terá que chamar a polícia.
 
- Faça isso, procure testemunhas que estejam ao seu lado e tenha muita paciência, pois nem sempre os agentes estatais são capacitados para lidar com casos de discriminação. Lembre-se que você não fez nada de errado e tenha calma.
 
- Caso a ocorrência se dê em dias úteis e no horário comercial, você pode acionar o DECRADI (Delegacia de Crimes de Ódio e Intolerância), pelo número 3311-3555.

- E se eu me sentir acuado?
 
Nunca seja ingênuo de fazê-lo sozinho ou sem registrar o que está acontecendo. Assim você coloca em risco sua integridade à toa. Procure alguém para acompanha-lo e grave tudo. De preferência, o faça escondido, pois você não quer provocar a raiva do agressor. Volto a dizer, nunca perca seu tempo com pessoas que não vão resolver nada. Vá falar diretamente com o responsável pelo estabelecimento.
 
- Em caso de agressão física ou moral, a quem recorrer?
 
Sempre recorra à polícia. Independentemente de homofobia ser crime ou não, você é uma pessoa que foi agredida e ela tem o dever de te socorrer. Como disse antes, se a agressão tiver ocorrido em dias úteis e no horário comercial, você pode acionar o DECRADI (Delegacia de Crimes de Ódio e Intolerância), pelo número 3311-3555.
 
- Um estabelecimento pode pedir para o cliente gay não se beijar no espaço?
 
O restaurante pode proibir certos comportamentos dentro de suas dependências, afinal ninguém é obrigado a consumir aqui ou ali. Além disso, ele tem o direito de selecionar sua clientela, por exemplo, cobrando caro ou exigindo um traje assim ou assado. No Jockey Clube de SP, por exemplo, homem não entra sem calça.
 
O que não pode ser feito, porém, são exigências ilegais, isto é, que violem a lei, por exemplo exigências discriminatórias com base em identidade de gênero e orientação sexual. Se o restaurante não quer beijo gay, também terá que coibir beijo heterossexual, caso contrário incorreria em discriminação.
 
- Qual é a pena para um restaurante que tenha a postura e ação discriminatória?
 
No caso do beijo gay, o artigo 2º, inciso VIII, da lei estadual n. 10.948/2001 classifica como ilícito administrativo a discriminação de casais gays. A pena para o estabelecimento comercial varia da simples advertência, passa pela pena de multa (que varia de 20 a 60 mil reais) e pode chegar a suspensão ou cassação da licença estadual de funcionamento.
 
Isso não exclui uma ação civil de indenização por danos morais, tampouco uma ação criminal, já que a conduta constitui crime contra o consumidor (Recusa de atendimento), cuja pena varia de 2 a 5 anos, de acordo com o artigo 7º da Lei n. 8.137/1990.

- Dos casos que se tornaram público e que chegam até a você, as pessoas tomam alguma medida legal?
 
As pessoas costumam procurar, sim, meu auxilio legal. No entanto, poucas pessoas realmente dão seguimento no processo e isso por inúmeros motivos. Tem gente que simplesmente quer esquecer o ocorrido, mas se equivoca ao acreditar que não tomar nenhuma providência vá ajudar. Está colocando a sujeira embaixo do tapete e isso pode ter consequências psicológicas no futuro, por se tratar de problema não resolvido. Tem gente que não tem dinheiro para contratar um advogado ou simplesmente tem outras prioridades no momento. Cada um sabe o que lhe incomoda mais. E tem gente que nem tem conhecimento dos seus próprios direitos.
 
- Qual é a importância da denúncia?
 
Quando elas buscam a Justiça, elas não estão apenas resolvendo um problema pessoal, mas um problema que assola todos nós. E se a vítima abre mão de buscar seus direitos, ela legitima o sistema que existe hoje, em que LGBT vivem com medo. Afinal, o agressor sabe que pode fazer o que quiser, pois ninguém fará nada.

"UMA VOZ PELOS IDOSOS NO MOVIMENTO LGBT" Por Jarid Arraes


 
Por Jarid Arraes para a Revista Fórum
 
O escritor, dramaturgo e militante dos direitos LGBT Ricardo Rocha Aguieiras, 68 anos, conta um pouco de sua trajetória contra o ódio aos homossexuais e a rejeição aos idosos.
 
O movimento LGBT brasileiro é uma arena de debates internos cheia de questões a serem resolvidas. Em um momento em que o conservadorismo avança e os setores fundamentalistas unem-se para barrar os direitos de lésbicas, gays, bissexuais e pessoas trans – muitos dos quais são direitos já conquistados -,  ainda há espaço para demandas internas de representação, visibilidade e acolhimento de pessoas marginalizadas.
 
Lamentavelmente, muitas dessas demandas não conquistam o devido espaço, já que nem sempre conseguem se enquadrar nas lógicas atuais de consumo e do culto à beleza. A questão do envelhecimento LGBT é uma dessas demandas preteridas e invisibilizadas. Apesar disso, a luta pelos gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais idosos conta com vozes pontuais na chamada para a luta. Ricardo Rocha Aguieiras é uma dessas vozes; aos 68 anos de idade, ele é escritor, dramaturgo e militante dos direitos LGBT e conta um pouco de sua trajetória contra o ódio aos homossexuais e a rejeição aos idosos.
 
Fórum – Como e quando começou a sua atuação na militância LGBT?
 
Ricardo Aguieiras – Por volta de 1977, fui levado por um namorado meu a uma festa, e nessa festa estava o já então escritor e cineasta João Silvério Trevisan, que tinha acabado de voltar dos Estados Unidos. Ele me convidou para umas reuniões pois pretendia criar um grupo de homossexuais, homens e mulheres, para lutarem pelos direitos e pela discussão da homossexualidade, que depois se tornou o SOMOS – Grupo de Afirmação Homossexual, fundado em 1978. O nome “Somos” era uma homenagem que fazíamos à uma publicação argentina que já existia e que já discutia a homossexualidade. O Somos cresceu muito, acabou criando vários subgrupos espalhados e virou um fenômeno até hoje estudado.
 
Aguieiras – Bom, era a ditadura militar ainda, apesar de já dando os primeiros sinais de abertura política. Não havia partidos outros além da Arena, que apoiava a ditadura e o MDB, que exercia a possível oposição permitida. Portanto, nosso movimento não era nem partidário e nem ideológico como hoje. Havia apenas um inimigo (declarado): a ditadura. Então era mais fácil lutar, o que não era “situação”, era oposição e ponto! Outra coisa que existia era um senso de empatia, carinho, afeto e solidariedade entre militantes, que depois deixou de existir, quando a ideologia entrou de assalto no meio, junto com a Convergência Socialista. A luta não se resumia às reuniões, tomava nossas 24 horas e nosso cotidiano. Acreditávamos, ingenuamente, na construção de uma nova sociedade, a que estava lá não nos contemplava nem nos interessava. Hoje, sinto que buscam assimilação e o ativismo está totalmente partidarizado,  interessam mais os dogmas de um partido que as questões LGBT.
 
Fórum – Como você enxerga o movimento LGBT atual? Você tem alguma crítica?
 
Aguieiras – Sim, tenho. Evidente que faço – mesmo que não seja o melhor a ser feito – comparações. Não existia a internet e isso tem que ser assimilado e contextualizado. Como tenho uma formação anarquista e tento me distanciar ao máximo do Poder, me incomoda profundamente o partidarismo dentro do Movimento LGBT de hoje, bem como dicotomias ideológicas de “esquerda” e de “direita” que acho insuficientes, não refletem todas as idiossincrasias humanas, nem ao menos minimamente. Não se enxerga mais o outro militante como um amigo, mas como um colega de luta, apenas. E, se for de ideologia diferente vira rival, não colega. Outra coisa que vem ocorrendo, infelizmente, e de uma gravidade que as pessoas ainda não se tocaram, são as demandas da população de transexuais e travestis que estão gerando brigas, acirramentos, acusações e separações. Não vejo solução a médio prazo, tudo é muito novo, inclusive os discursos, e as pessoas não conseguem nem acompanhar nem absorver tudo.  Então vem o ódio. Essa questão é tão grave que vem causando rompimentos nos movimentos de diversos países, como na Argentina onde as pessoas trans não estão mais na sigla “LGBT”, criando um movimento à parte.
 
Fórum – Alguns meses atrás, você tinha em seu perfil do Facebook uma foto onde segurava um cartaz com os dizeres: “Gays idosos também são (muito) gostosos”. Por que teve essa ideia? O que essa frase representa para você?
 
Aguieiras – A ideia surgiu por volta de 2004. Eu sentia as pessoas envelhecendo – inclusive eu – mas envelhecendo de uma forma diferente de como envelheceram meus pais e avós e as gerações que vieram antes de mim. Tínhamos mais força, mais disposição e… mais sonhos. A vida não acabava aos 40 ou 50 como antes. Só que as discussões não aconteciam dentro do Movimento LGBT, apesar do restante da sociedade já estar se preparando para o fato. Vivemos mais, inegável, mas e a qualidade dessas vidas? Numa sociedade que sempre negou a morte e se recusa a pensar sobre o morrer; numa sociedade que cultiva o mito da juventude eterna, envelhecer é muito, muito difícil, algo a ser repudiado como se fosse um pecado ou crime. Se falar na população LGBT e mais especificamente nos homossexuais, a coisa se complica bem mais: total invisibilidade.
 
Fórum – Você acha que pessoas homossexuais, bissexuais e trans idosas sofrem mais preconceito que as mais jovens? Quais são as especificidades e demandas políticas dos LGBTs idosos?
 
Aguieiras – A luta LGBT sempre foi pelo direito ao amor. E amor remete ao direito à libido. Como, se idosos e idosas são vistos como anjinhos fazendo tricô em cadeiras de balanço e, se muito, vendo a novela das seis e indo dormir às oito? Chega a ser o maior paradoxo do mundo atual: os preconceitos com idosos cresceram tanto quanto os avanços da medicina na prevenção de doenças provocadas pela idade. Eu sabia que teria que resgatar o Direito à libido dos envelhecentes LGBT, sabia que teria uma briga árdua para mostrar que corpos envelhecidos são tão belos quanto corpos jovens e que existem pessoas que se atraem fortemente por idosos e idosas. Para isso, eu teria também que discutir a solidão e a invisibilidade, mostrar que precisamos de medidas específicas pois temos problemas específicos, que HIV em envelhecentes LGBT é diferente de HIV em outros envelhecentes, há outras formas de tratar, há outras doenças oportunistas. Como é o corpo de uma transexual com HIV, por exemplo, após anos e anos de tratamento hormonal? E a reação a medicamentos? Nada se sabe e me olham com espanto quando  pergunto.
 
Não se pensa e se acha que é um “luxo” moradias específicas para idosos e idosas LGBT, acham que o discurso é único e não é. Daí veio o meu resgate à gostosura envelhecida. Coloquei “gays idosos”, por que não posso falar pelas lésbicas, pelas pessoas trans e por intersexuais. Penso que cada segmento deve ter autonomia, falar por si. Eu sei da minha dor… e do meu prazer (risos).  Como gay, sei que sofrerei difamações até mesmo depois de morto. Uma coisa é ser preconceitualizado por sua orientação sexual. Outra, bem diferente, é enfrentar esse mesmo preconceito somado à velhice. Não quero nem voltarei ao armário por causa da fragilidade provocada pelos anos. Mesmo que cuidadores exijam isso de mim. Seria mais uma tortura e essa eu não saberia suportar.
 
Fórum – Quer dizer que as pessoas LGBT idosas são pressionadas a retornar ao armário? Isso acontece?
 
Aguieiras – Com muitas, sim. Houve, tempos atrás, um caso que ficou conhecido, de uma travesti, a Carla Suely, que vivia bem em um asilo em Santo André, cidade da Grande São Paulo. Ela ficava na ala feminina. Um dia se abriu para uma enfermeira e para uma colega. Estava formada a confusão. As idosas não a queriam na ala feminina, alegavam que “era um homem vestido de mulher, podiam fazê-las mal” e os idosos, de antemão, também não quiseram que ela viesse para a ala masculina, falaram um monte, inclusive “desrespeito”, então, essa senhora teve que deixar o asilo e não sei que fim teve isso. Não vi vontade política por parte da militância em ir a fundo nessa questão. Depois, ouvi umas queixas de gays idosos que frequentavam o bar Caneco de Prata, em São Paulo, que é uma espécie de “gueto” deles: queixas de que a família só ajudaria quando fosse necessário, se nada sobre a homossexualidade viesse à tona. O Jornalista Neto Lucon fez uma pesquisa junto aos asilos de São Paulo. Ele ligava ou ia até eles e, ao falar com quem administrava sempre ouvia “aqui não tem isso de gay, não”. Ou seja: só confirmou…
 
Fórum – O movimento LGBT já lançou campanhas sobre esse fenômeno no Brasil?
 
Aguieiras – Não, campanhas mesmo, nunca. Depois de mim, só teve coisinhas tímidas dentro do Movimento LGBT. Para ser justo, a Coordenadoria de Assuntos de Diversidade Sexual (CADS) de São Paulo, que é ligada à Prefeitura, em sua gestão anterior me convidou (2011) para ajudar a escrever folhetos sobre LGBT idosos e idosas e envelhecimento. Eu escrevi, foram lançados e distribuídos, mas eu achei que teria que ter mais e ser uma ação constante. Em 2010, a Associação da Parada LGBT de São Paulo me ofereceu o trio elétrico. Mas veja o que ocorreu: Me deram uns 60 convites para que eu distribuísse, evidente que para LGBT idosos e idosas. Se eu consegui uns 4, foi muito. O restante, para aproveitar, dei para amigos jovens, na faixa dos 30 anos, 40… e até menos. E olha que eu passei um mês correndo atrás de pessoas. Foi triste. Concluo, então, que a culpa não é apenas da Militância LGBT, mas dos e das idosos e idosas LGBT, também. Não se sentem estimulados para participarem de reuniões, paradas, não se sentem contemplados politicamente, enxergam tudo como um movimento de jovens. Se bem que vejo, hoje, muito desse comodismo também em jovens, que agora esperam tudo do governo e de partidos.
 
Fórum – O que você propõe para dar mais visibilidade às demandas dos idosos LGBT?
 
Aguieiras – Qualquer discussão sobre envelhecimento LGBT é válida. A historiadora carioca e militante LGBT Rita Colaço fez, uma vez, uma ampla matéria usando exemplos lá de fora, para moradias e espaços para LGBTs envelhecentes. Ela, inclusive, fez um levantamento de custos, usando materiais mais baratos e sustentáveis para a construção das casas. O grande militante mineiro Osmar Rezende já fez, em Belo Horizonte, dois seminários sobre LGBTs idosos, fui convidado e nunca pude ir. Então, temos que ir tocando o barco, na esperança de que uma hora deslanche. O começo é justamente eu e o que eu fiz, chamei a atenção para um fato outrora invisível, iniciei a discussão. Mas estou quase sozinho nessa, quase.

Gays assumidos tem menos chances de conseguir emprego


Por Marcelo Haubrich para o Pheeno
 
Triste! Uma pesquisa da Anglia Ruskin University mostrou que os LGBTs ainda tem uma grande luta pela frente contra a discriminação! Homossexuais assumidos ou engajados com a causa enfrentam mais dificuldade no momento de conseguir um emprego.
 
Dois tipos de currículos diferentes foram enviados para concorrer à vagas anunciadas em seis sites de emprego online, totalizando 9.062 candidaturas. Ambos os tipos eram idênticos, com uma única diferença na seção “Interesses”, em que um candidato colocava ser voluntário para uma Instituição ambiental e, outro, se dizia membro voluntário de uma associação LGBT.
 
O levantamento descobriu que a probabilidade de candidatos gays serem chamados para uma entrevista de emprego foi 39% menor do que os heterossexuais. A situação é ainda pior para as lésbicas, que tiveram 42,7% menos probabilidade de receber um convite.
 
Nick Drydakis, chefe da pesquisa, afirma que o processo de contratação é a parte menos compreendida da relação de trabalho, apesar de ser a mais importante. “As empresas perdem potenciais talentos graças a essa contratação tendenciosa, e os gays ganham uma grande dor de cabeça na busca por emprego”, diz o pesquisador. Até quando?!