Publicado pelo UOL Esporte
Por Luis Augusto Símon "Meu nome não tem i. É com dois ipsilones. Tenho 39 anos, sou baiano e deputado federal pelo PSOL do Rio. E sou gay, foi por isso que você me ligou, não é"? Assim, o deputado Jean Wyllys – escolhido duas vezes como o melhor do Congresso – se definiu ao final da entrevista, em que falou sobre seu apoio à criação de torcidas de futebol com componentes gays e o cuidado que se deve tomar com a segurança, por conta da homofobia que ele vê muito presente no futebol.
O deputado gostaria de ver um jogador de futebol saindo do armário, mas nunca pressionaria para que isso acontecesse. Sabe que seria importante, mas não sonha com isso. "Meu sonho é maior. Sonho com um país sem preconceito e racismo e que assumir sua condição sexual seja uma coisa normal e não bandeira de luta".
Confira a entrevista:
A tentativa de criação da torcida gay Gaivotas da Fiel foi repudiada pelos outros torcedores corintianos. A Coligay, pioneira torcida do Grêmio, também acabou. O senhor acha que essas torcidas ajudam a integração e a luta contra os preconceitos ou são apenas um gueto a mais?
A criação de torcidas gays pode ajudar sim a luta contra a homofobia. Na teoria, o esporte é um meio de integração de pessoas, é um meio de socialização. É muito bonito ver torcedores caminhando juntos, carregando bandeiras para incentivar o seu time. Deveria aceitar todas as pessoas nesse tipo de celebração. A teoria é essa, mas a prática não é. Por isso, é preciso ter cuidado com a criação de torcidas gays.
Por quê?
As torcidas organizadas são homofóbicas. Para ser homofóbico, não precisa matar um gay. Basta mostrar e exercitar o preconceito que está arraigado. Você viu o que a torcida do Corinthians fez com o Sheik? Mostrou toda sua homofobia, com faixas e vaias apenas porque ele deu um selinho em um amigo e colocou no Instagram. Foi obrigado a pedir desculpas. Então, é possível haver violência em um meio homofóbico como o futebol.
Mas o senhor é ou não a favor da criação das torcidas gays?
Sou a favor que elas sejam criadas, não desestimulo, mas é preciso saber que elas são potenciais vítimas de violência nos estádios. Acho que os clubes deveriam fazer uma campanha e incorporar esses torcedores. Eles podem contribuir com o futebol e com os times.
A torcida do Palmeiras incorporou o apelido de "porco". A do São Paulo deveria incorporar o "bambi"?
Olha, não vou responder essa pergunta. Eu nem sabia desses apelidos e acho que não devo me pronunciar. Poderia parecer uma gozação, um desrespeito, e não quero isso para um assunto tão importante como a luta contra a homofobia.
Michael, do vôlei, e Ian Matos, dos saltos ornamentais, assumiram a homossexualidade. Jogadores de futebol deveriam fazer o mesmo?
Teve também um jogador alemão e um da NBA. Se um jogador de futebol assumir haveria um impacto muito grande. Faria história. Seria uma referência para jovens que sofrem por não revelar. Imagine um garoto que tem dom para o esporte e desiste porque o pai diz que não existe atleta gay, que gay merece morrer, que gay é sujo. O garoto poderá dizer: "não é verdade, o jogador fulano é um atleta e é gay". Mas eu não aconselho ninguém a sair do armário. Isso é uma decisão de cada um.
Por que não aconselha?
Olha, eu sou um deputado muito conceituado. Já ganhei duas vezes o prêmio de melhor deputado do ano. Sou doutorando em antropologia. Sou reconhecido. E assim mesmo sofro calúnias e injúrias por ser assumido, mesmo com 39 anos. Não é prazeroso ler o que escrevem a meu respeito. Então, é uma decisão difícil. Mas, tem o outro lado, não é? Quem não sai do armário não vive a vida plena, vive uma vida escondida. Também não é bom.
A Copa e a Olimpíada poderiam levar uma mensagem contra a intolerância aos homossexuais?
Sim. E contra o racismo também. Seria o grande diferencial. Seria o grande legado, mais do que a construção de estádios. Nosso Brasil é maravilhoso pela mistura de etnias, somos filhos de brancos, negros e índios. Poderíamos mostrar orgulho desse amálgama e fazer uma Copa contra a intolerância.
O que o senhor achou da violência nos últimos jogos do Brasileiro?
Fiquei muito chocado. Para que isso diminua é preciso haver um esforço na educação. Não apenas do governo, mas também da educação doméstica. É em casa que é preciso explicar tolerância e mostrar que violência é errado. O terceiro vértice é a educação que precisa vir dos clubes. Eles ganham muito dinheiro e poderiam ajudar, poderiam ensinar seus torcedores a serem pessoas melhores.
Tem algum projeto nesse sentido?
Não tenho, por dois motivos: há outros deputados como Romário, Danrlei e Delei que são ligados ao futebol. Poderiam fazer melhor do que eu. Além disso, não creio que seja algo digno de um projeto de lei. A questão aí é de política pública, caberia ao Ministério dos Esportes, com o Aldo Rebelo fazer. Mas você me deu uma boa ideia. Vou falar com o Romário sobre isso.
O senhor torce para qual time?
Para nenhum. Apenas para a seleção. Sou gay e o mundo do futebol nunca me seduziu, há muita intolerância.
O senhor pratica esporte?
Gosto de caminhar e de andar de bicicleta.
Qual esporte o senhor mais gosta?
Aqueles ligados à arte, como ginástica artística: o Diego Hipólito é ótimo. E também de vôlei.
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