Ao avaliar pesquisa do Ipea, associação LGBT vê
avanço no combate à homofobia no país
A aceitação da sociedade ao ingresso de
homossexuais nas Forças Armadas reflete certa evolução no histórico problema de
discriminação e preconceito, na avaliação do presidente da Associação Brasileira
de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Toni Reis.
Segundo ele, apesar dos diversos problemas que ainda restam, a relação com o
tema vem sendo abordada de forma mais respeitosa. A avaliação tem como base
pesquisa divulgada na quarta-feira (29) pelo Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea), que registrou 63,7% de concordância dentro do universo
entrevistado de cerca de 4 mil pessoas. O levantamento teve objetivo de
conhecer a percepção da sociedade sobre assuntos relacionado aos militares, em
um contexto de democracia.
“Estamos percebendo que a sociedade tem evoluído
muito nesta questão, dada a discriminação e o preconceito. A relação tem sido
mais respeitosa no geral”, considera o ativista, destacando o papel da
juventude no ativismo pelo fim da homofobia. A decisão do Supremo Tribunal
Federal (STF) de reconhecer a união estável de homossexuais - em maio do ano
passado - teve papel decisivo para um início de mudança de comportamento da
sociedade. “A interpretação em âmbito federal de que temos direitos iguais
ajudou muito”, avaliou. Embora enxergue a pesquisa “com bons olhos”, Reis acha
que ainda há o que melhorar, para fazer desse percentual de aceitação um todo.
Apesar de desmentir preconceito em relação à
orientação sexual dos soldados das Forças Armadas, o Superior Tribunal Militar
(STM) já julgou e condenou casos relacionados. Em 2010, os ministros decidiram
pelo afastamento de um tenente-coronel que teve relacionamento com outro
soldado. No entendimento do relator, ministro José Américo, o fato prejudicou a
imagem das Forças Armadas. Opiniões contrárias, como a da revisora do caso,
ministra Maria Elizabeth Teixeira Rocha, versaram que a decisão de o tenente
homossexual ter ou não relacionamento seria assunto de cunho íntimo.
A discriminação nas Forças também é presente em
outros países. Nos Estados Unidos, a lei que proibia o ingresso de homossexuais
declarados no serviço militar foi revogada somente no ano passado. Durante 18
anos, soldados gays tinham de omitir sua orientação sexual por conta da lei,
conhecida como "Don't Ask, Don't Tell".
Segundo Toni Reis, é fundamental que haja a
educação para a diversidade, para que as pessoas aprendam o que é igualdade
desde cedo. “A juventude tem sido mais respeitosa, mas o machismo ainda é
problema sério. O homem que é seguro da sua sexualidade respeita o gay.
Geralmente, o homem inseguro é a pessoa que mais discrimina”, disse. Na
pesquisa, as mulheres ainda figuram como as que mais aceitam os gays, com
68,1%, ante 59,3% da opinião masculina. “As mulheres têm sido também alvo do
preconceito e machismo. Em todas as pesquisas são elas que mais apoiam a
comunidade”, ressaltou.
Participação feminina
A opinião sobre a participação do universo feminino nas Forças Armadas também chama a atenção. No mesmo levantamento do Ipea, a maior aceitação sobre ingresso das mulheres (51%) ficou próxima dos 40,4% que aceitam desde que soldados femininos realizem somente serviços auxiliares, sem entrar em combate. Jacira Melo, diretora do Instituto Patrícia Galvão, vê um olhar de mudança da sociedade quanto ao assunto, e destacou o avanço da presença feminina em cargos de grande evidência, tanto no setor empresarial quanto na política. “Isso significa que a sociedade acredita que as mulheres podem participar de todas as atividades. Eu vejo como um processo cultural natural”, disse.
Mas ainda há, segundo ela, a cultura de querer
preservar as mulheres de situações mais adversas. “Ao meu ver é um olhar mais
reservado, que aceita a mudança, mas ao mesmo tempo quer preservar”, completou.
Rachel Moreno, coordenadora geral do Observatório
da Mulher, pondera que existe outro viés a ser considerado nesta avaliação
pontual, em razão de uma “cultura de paz” em que o papel das Forças Armadas
está inserido. “Eu acho que a limitação de mulheres em termos específicos no
mercado de trabalho em geral, transferidas para serviços de menor importância,
carga de decisão e remuneração é ruim, e significa teto de vidro”, afirmou. No
caso do serviço militar, segundo ela, a questão tem uma “faceta adicional”, que
é da tentativa de auxiliar a sociedade. “As mulheres podem dar a vida, por isso
estão mais envolvidas”, pontuou. Ela lembrou também o caso do Exército de
Israel, em que as mulheres desempenham papel militar, mas atuam nos serviços
auxiliares.
Também psicóloga, Rachel considera que há um leque
de opções para o serviço militar se inserir em serviços considerados auxiliares
e de cunho social, não só para mulheres, mas também para os homens. “Eu vejo
que nosso Exército em alguns momentos, não sei se certo ou errado, tem
desenvolvido ações preventivas. Tem áreas de risco, áreas de enchente, onde
falta saúde, uma série de lugares que precisam de auxílio”, frisou. No Brasil,
existe a discussão para a criação do serviço civil para os candidatos a
alistamento que não quiserem cumprir o serviço militar. Neste serviço, os
jovens desempenhariam atividades como a prestação de serviços
comunitários.
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