Visto em O GLOBO
Aos 35, Vicky Beeching contou nunca ter tido um relacionamento por conta do conflito existencial em torno de sua sexualidade.
Fãs evangélicos da cantora gospel Vicky Beeching, de 35 anos, podem levar ao susto ao ler
os jornais nesta semana. Em entrevista ao periódico inglês "The Independent",
Beeching declarou que é gay, e que mesmo assim, Deus a ama do jeito que ela é.
A artista é um dos maiores ícones dentro da Igreja Anglicana. Formada em Teologia
em Oxford, na Inglaterra, Beeching também se popularizou ao comentar aspectos
religiosos do dia a dia, conquistando hordas de fieis. Escrevendo canções gospel
desde os 11 anos, a cantora já fechou contrato com duas gravadoras internacionais e
vendeu milhões de discos no chamado “Cinturão da Bíblia” dos Estados Unidos.
Na entrevista, Beeching diz que foi criada por pais evangélicos conservadores. Na
escola, livros diziam que a homossexualidade era pecado, “coisa do demônio”. Mas isso
não foi o suficiente para que ela não começasse a se sentir atraída por outras meninas,
ainda aos 12 anos:
- Perceber que eu estava atraída por elas foi uma sensação horrível. Eu estava
tão envergonhada! Era uma luta, porque eu não podia contar a ninguém – confessou.
Ao se dar conta de sua homossexualidade, Beeching entrou em depressão, acreditando
que estava pecando e que não poderia ser “curada”. Aos 13, ela chegou a pedir a Deus
que ou tirasse a vida dela, ou a atração por outras meninas. Com 16, durante uma colônia de férias cristã no interior da Inglaterra, a cantora chegou a se submeter a uma sessão de exorcismo, em vão.
- Lembro de muitas pessoas colocando as mãos nos meus ombros, orando muito alto e,
em seguida, gritando coisas tipo: 'Nós ordenamos que Satanás saia! Saia fora, corja
de demônios! Nós falamos a vocês, demônios da homossexualidade: deixem a menina
em paz!'.
Isso foi a gota d`água para Beeching, que se sentiu humilhada com a situação. Na entrevista,
a cantora contou que o episódio serviu para que ela se tornasse mais introspectiva,
buscando outras soluções por conta própria. Dedicou-se aos estudos, formando-se
em Teologia em Oxford e seguindo logo depois para Nashville, no Tennessee, atraída
pela carreira de compositora. Por lá, imersa no centro do conservadorismo
evangélico americano, gravou discos e percorreu grandes igrejas do país para mostrar
suas canções.
Mas amores frustrados por amigas e outras mulheres a perseguiam como uma sombra.
Nesse meio tempo, Beeching teria tentado até começar relacionamentos com homens,
todos sem sucesso.
Em 2008, aos 29 anos, ela decidiu se mudar para a Califórnia, esperando que San
Diego fornecesse um ambiente mais liberal. Mas este foi o ano em que a Proposição 8,
lei estadual que proíbe o casamento homossexual, estava para ser votada.
Em paralelo, Beeching cumpria sua série de shows agendados em igrejas do estado.
No início de 2014, a artista descobriu ter uma doença rara de pele, que deixava a
epiderme com marcas de cicatriz, podendo levar até a morte. Durante uma
sessão de quimioterapia, a cantora pensou consigo mesmo que deveria resolver sua
situação pessoal. Ela já tinha 35 anos:
- Olhei para o meu braço com a agulha da quimioterapia, olhei para a minha vida, e
pensei: 'tenho que entrar em acordo com quem eu sou' – afirmou Beeching na
entrevista. - Trinta e cinco é metade de uma vida, e eu não posso perder a outra
metade. Perdi tanta vida como uma sombra de uma pessoa.
Até então, Beeching nunca tinha mantido um relacionamento homossexual. O tratamento
da doença a fez refletir e aceitar gradualmente sua homossexualidade. Na Páscoa, ela
revelou aos seus pais a situação, que acabaram se desculpando por fazerem ela passar
pelos constrangimentos. Beeching e eles concordaram em discordar sobre a teologia.
Ao final da entrevista, a cantora afirmou que espera agora que a Igreja Anglicana
siga o exemplo acolha fieis homossexuais.
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