sábado, 9 de novembro de 2013

"Menino brinca de boneca?" Por MARY NEIDE DAMICO FIGUEIRÓ




A possibilidade de menino brincar com boneca assusta os adultos, sobretudo, o pai. A boneca é um brinquedo, assim como o carrinho, a bola, um kit com brinquedos de bombeiro ou de médico etc. Em sua fantasia, em seu mundo da imaginação, ao brincar, a criança costuma fazer de conta que é gente grande. Brincar é importante para o lazer, a distração e o desenvolvimento emocional e intelectual. Os brinquedos, comumente, têm relação direta com o mundo real. Atualmente, muitos homens dão banho em seus filhos, trocam fraldas, levam-nos para passear etc. Temos caminhado para uma não divisão das tarefas no lar, sobretudo, da tarefa de cuidar e de educar os filhos, assim como, para a igualdade na realização da vida profissional. Os tempos mudaram e é bom que o homem saiba, por exemplo, cozinhar, lavar louça etc, não para ajudar a mulher, mas para participar de todas as atividades do lar, cujos produtos finais são necessários para o bem estar de todos os membros da família. Brincar de boneca, para as crianças, é brincar de mamãe ou de papai. 

Assim sendo, pode-se comprar bonecas também para meninos, sem que isso signifique estar estimulando uma identificação feminina. Brincar de boneca não torna um menino uma menina, ou um gay, assim como brincar de carrinho não faz da menina um garoto. É interessante conversar com as crianças, de ambos os sexos, que homens e mulheres podem fazer de tudo e que, assim como o pai cuida dos seus filhos, é normal um menino brincar de boneca. Pode-se falar para a criança que muitas pessoas não entendem e/ou não aceitam isso com naturalidade. Assim, o menino que brincar de boneca e a menina que brincar de carrinho deverão estar preparados para lidar com possíveis chacotas.

Classificamos como sexista o mundo no qual tudo é separado: coisas de meninos; coisas de meninas; trabalho (ou atividade esportiva ou de diversão) de homem; trabalho (ou atividade esportiva ou de diversão) de mulher. O sexismo precisa ser revisto e eliminado, pois oprime ambos os sexos. Seja no trabalho ou no lazer, a pessoa deve fazer aquilo que lhe interessa e lhe desperta prazer, "independente do que tem no meio das pernas". Isto significa ser sujeito de sua própria vida. Temos que ensinar nossas crianças a questionar, desde pequenas, a ideia ultrapassada de que azul é cor de meninos, e rosa, de meninas, e a concepção de que mulher tem que ser delicada e homem tem que ser forte. É importante considerar que há muitos jeitos de ser homem e muitos jeitos de ser mulher, assim como, há variações no tipo físico dentro de cada um dos dois grupos. Um homem pode ser afetuoso e delicado sem que isso interfira em sua orientação sexual.

É triste quando vemos pais ou professores forçando meninos a jogar futebol ou a praticar judô, por exemplo, sem que eles se sintam motivados, ou impedindo-os de fazer algo que gostem, como dançar balé. O filme Billy Elliot, de 2000, ilustra isto de forma brilhante. Da mesma forma, algumas garotas são impedidas de jogar futebol ou praticar esportes que, em nossa cultura, erroneamente, são classificados como, especificamente, masculinos. 

Vivi minha adolescência na década de 1970 e pude ter o prazer de acompanhar mudanças expressivas no mundo feminino: a possibilidade de usar batom vermelho e de conversar com algum jovem ou homem (conhecido ou não) na rua, sem ser chamada de puta; de dirigir sem ser considerada mulher macho; de usar calça comprida; de fazer faculdade, seja de que área for; de trabalhar em profissões "tidas como masculinas"; de ter direito ao prazer sexual, mesmo solteira; entre outras mudanças. E no mundo dos homens? Tem havido mudanças expressivas, a partir dessa mesma década? Será que não são os próprios homens que estão engessando as mudanças em seu mundo, a começar, por não consentir que o menino brinque com boneca, impedindo-o, assim, de exercitar-se para que, no futuro, possa ser pai com mais segurança e espontaneidade?

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