domingo, 13 de maio de 2012

Especial Dia das Mães: "Em nome da união da família" Por Émerson Maranhão


Edith e seu filho Marcello

Por Émerson Maranhão para o jornal O Povo
Dica do Querido Amigo Flávio Alves (do Ideias Canhotas)

Fundadora do Grupo de Pais de Homossexuais (GPH), Edith Modesto defende, em entrevista exclusiva ao O POVO, que mães de gays e lésbicas vençam o preconceito e convivam em harmonia com a orientação sexual de seus filhos


A vida de Edith Modesto mudou radicalmente quando, em 1992, Marcello, o caçula dos seu sete filhos, lhe revelou ser homossexual. Eram outros os tempos, e se hoje ainda é difícil lidar abertamente com a orientação sexual diversa de um filho, imagine há 20 anos. Edith procurou ajuda para entender o que se passava, não encontrou. Buscou interlocução com mães que vivessem a mesma situação, também não foi bem sucedida.

A alternativa mais fácil seria permanecer na ignorância e fazer do preconceito seu principal conselheiro. Mas Edith optou por outro caminho. Arregaçou as próprias mangas e passou a pesquisar sobre diversidade de orientação sexual. Não só. Arrebanhou outras mães de homossexuais e com elas fundou um grupo para trocarem experiências sobre o assunto.

Hoje ela é referência nacional quando o tema é a aceitação familiar da homossexualidade. Nesta entrevista exclusiva ao O POVO, Edith Modesto fala sobre como se dá este processo:

O POVO - Qual é a importância de pais aceitarem a diversidade sexual dos filhos?

Edith Modesto - É fundamental. Quando eles são jovens, a coisa mais importante do mundo para eles é a aceitação dos pais. Tudo que eles mais querem é ser aceitos, principalmente pelas mães. É uma postura muito importante para a vida toda. Faz muito mal a eles quando não há esse apoio. Porque eles terão que enfrentar uma dificuldade maior que a dos outros jovens. Eles mesmos têm que se autoaceitar, que passar pelo processo de autoaceitação, por causa do preconceito que está internalizado em todos nós. Eles passam por um processo dificílimo, sem o apoio dos pais é mais complicado ainda.

OP - Em que momento este diálogo deve começar em casa?

Edith - Este diálogo deveria vir desde que a mãe percebesse que tem um filho diferente. A diversidade é que é a norma neste mundo. O que nos rege é o que é diferente, não o que é igual. Em todos os sentidos. Mas temos dificuldade em entender isso. As mães continuam com dificuldade para conviver e aceitar a diversidade porque a gente aprende que ser heterossexual é que é o correto. Algumas, mais religiosas, acham que é pecado, outras acham que é doença. Isso é muito difícil para as mães. É um processo que continua difícil, apesar de ter melhorado um pouco porque a maioria já aceita a homossexualidade na casa dos outros. Mas na própria casa, quando o filho sai do armário, a mãe entra.

OP - Por que a mãe “entra no armário quando o filho sai”?

Edith - Principalmente por causa da vergonha e da culpa. São os dois sentimentos que aparecem no início do processo e demoram muito para acabar. Culpa, porque elas acham que são culpadas do filho ser gay - tudo sempre é culpa da mãe, não é? Então fica difícil. E a vergonha é dos outros, do que os outros vão pensar, do que vão dizer.

OP - Ao que parece é uma situação muito delicada, para dizer o mínimo.

Edith - As coisas já estão melhorando. No caso das mães, o amor sempre vence, mesmo entre aquelas que passam por grandes dificuldades neste processo. Tem mães que tentam suicídio, que começam a beber, que precisam ir para o Alcoólatras Anônimos, que entram em depressão profunda, somatizam e ficam muito doentes quando descobrem que seus filhos são gays ou lésbicas. Como elas amam o filho, com o tempo, procuram o nosso grupo, começam a ler sobre o assunto, tiram dúvidas com pessoas que se especializaram em diversidade sexual... Mas o combustível, a energia que faz esse processo se desenvolver é o amor.

OP - É um caminho, então, que não é fácil para nenhum dos lados envolvidos?
Edith - Não é fácil, e é muito semelhante para os filhos e para os pais. Os jovens passam até cinco, sete, 10 anos para se aceitarem. E com os pais acontece a mesma coisa - com raras exceções. Quando a família está unida todos ganham. A dificuldade faz com que a família fique mais unida ainda. Um filho gay pode deixar a família desunida ou unir a família para sempre. Nós trabalhamos para que a família fique unida para sempre. A família se une para resolver a questão que foi considerada um problema, mas não é, só tem a aparência de um problema.

OP - A senhora está falando muito em família. Costuma-se dissociar homossexualidade e apego familiar...

Edith - Pelo contrário, gays amam suas famílias. Esta é a verdade. A coisa que eles mais querem é ser aceitos pelos pais. Eu recebo centenas de mensagens de jovens por semana. De jovens que querem que eu os ajude a falar com os pais, para que eles os aceitem.

OP - Em que uma relação mãe e filho ganha com esta convivência aberta com a homossexualidade do filho?

Edith - Veja bem, não tem coisa melhor que essa relação. A relação afetiva mais importante do mundo é a mãe com o filho e vice-versa. Todas as relações são importantes, claro, mas a relação com uma mãe é fundamental. Mãe é só uma - graças a Deus, até porque ninguém aguentaria ter mais de uma não é? (risos). Mas voltando à sua pergunta, por que desperdiçar uma relação tão bonita e importante com mentiras? Com uma vida escondida? Isso não faz o menor sentido. Esta é a principal razão dos ganhos desta convivência.

OP - O título de um dos livros que a senhora escreveu é justamente Mãe sempre sabe?. Eu lhe pergunto: uma mãe sempre sabe que seu filho é homossexual?

Edith - Não acredito que você me perguntou isso (risos). Se eu lhe responder, ninguém mais vai precisar ler o livro e assim você atrapalha o meu marketing (risos). Eu coloquei a pergunta no título justamente para provocar a curiosidade e para meus leitores se perguntarem quando terminarem de ler se eles sempre souberam. 

OP - É possível para a mãe de um homossexual aqui no Ceará receber orientação à distância do Grupo de Pais de Homossexuais?

Edith - Sim, é possível. Eu converso com mães do Brasil todo por telefone. Se tiver um número de telefone fixo, eu mesmo ligo. Também converso pela internet. Elas podem entrar no nosso grupo virtual e vão receber orientação e acompanhamento. É um serviço gratuito, o trabalho é voluntário. Também converso muito todos os dias com jovens gays em busca de aceitação da família. São os meus filhos de coração.
Perfil

Edith Modesto é a fundadora do Grupo de Pais Homossexuais (GPH). É escritora, professora universitária e pesquisadora, mestra e doutora em Semiótica francesa pela USP, terapeuta, especialista em diversidade sexual e questões de gênero.

Há 20 anos, ela descobriu que Marcello, o caçula de seus sete filhos, é homossexual. Começou então a pesquisar sobre diversidade na orientação sexual na tentativa de compreender o universo do filho. Em 1997, fundou, com apenas três outras mães de homossexuais, o embrião do que viria a ser hoje o GPH. É autora dos livros Vidas em arco-íris – Depoimentos sobre a homossexualidade, Mãe sempre sabe? Mitos e verdades sobre pais e seus filhos homossexuais, Entre mulheres - Depoimentos homoafetivos e Homossexualidade: Preconceito e Intolerância, sua tese de doutorado.
SERVIÇO
Grupo de Pais de Homossexuais (GPH)
Site: www.gph.org.br 
Endereço: Rua Alberto Faria, 835, Alto de Pinheiros, São Paulo/SP
Fone: (11) 3031 2106 
Email: mães-de-homos@uol.com.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário