Edith e seu filho Marcello
Por Émerson Maranhão para o jornal O Povo
Dica do Querido Amigo Flávio Alves (do Ideias Canhotas)
Fundadora do Grupo de Pais de Homossexuais 
(GPH), Edith Modesto defende, em entrevista exclusiva ao O POVO, que 
mães de gays e lésbicas vençam o preconceito e convivam em harmonia com a
 orientação sexual de seus filhos
A vida de Edith Modesto mudou radicalmente quando, em 1992, Marcello,
 o caçula dos seu sete filhos, lhe revelou ser homossexual. Eram outros 
os tempos, e se hoje ainda é difícil lidar abertamente com a orientação 
sexual diversa de um filho, imagine há 20 anos. Edith procurou ajuda 
para entender o que se passava, não encontrou. Buscou interlocução com 
mães que vivessem a mesma situação, também não foi bem sucedida. 
A
 alternativa mais fácil seria permanecer na ignorância e fazer do 
preconceito seu principal conselheiro. Mas Edith optou por outro 
caminho. Arregaçou as próprias mangas e passou a pesquisar sobre 
diversidade de orientação sexual. Não só. Arrebanhou outras mães de 
homossexuais e com elas fundou um grupo para trocarem experiências sobre
 o assunto.
Hoje ela é referência nacional quando o tema é a aceitação familiar da homossexualidade. Nesta entrevista exclusiva ao O POVO, Edith Modesto fala sobre como se dá este processo:
O POVO - Qual é a importância de pais aceitarem a diversidade sexual dos filhos?
Edith Modesto
  - É fundamental. Quando eles são jovens, a coisa mais importante do 
mundo para eles é a aceitação dos pais. Tudo que eles mais querem é ser 
aceitos, principalmente pelas mães. É uma postura muito importante para a
 vida toda. Faz muito mal a eles quando não há esse apoio. Porque eles 
terão que enfrentar uma dificuldade maior que a dos outros jovens. Eles 
mesmos têm que se autoaceitar, que passar pelo processo de 
autoaceitação, por causa do preconceito que está internalizado em todos 
nós. Eles passam por um processo dificílimo, sem o apoio dos pais é mais
 complicado ainda.
OP - Em que momento este diálogo deve começar em casa? 
Edith
  - Este diálogo deveria vir desde que a mãe percebesse que tem um filho
 diferente. A diversidade é que é a norma neste mundo. O que nos rege é o
 que é diferente, não o que é igual. Em todos os sentidos. Mas temos 
dificuldade em entender isso. As mães continuam com dificuldade para 
conviver e aceitar a diversidade porque a gente aprende que ser 
heterossexual é que é o correto. Algumas, mais religiosas, acham que é 
pecado, outras acham que é doença. Isso é muito difícil para as mães. É 
um processo que continua difícil, apesar de ter melhorado um pouco 
porque a maioria já aceita a homossexualidade na casa dos outros. Mas na
 própria casa, quando o filho sai do armário, a mãe entra.
OP - Por que a mãe “entra no armário quando o filho sai”?
Edith
  - Principalmente por causa da vergonha e da culpa. São os dois 
sentimentos que aparecem no início do processo e demoram muito para 
acabar. Culpa, porque elas acham que são culpadas do filho ser gay - 
tudo sempre é culpa da mãe, não é? Então fica difícil. E a vergonha é 
dos outros, do que os outros vão pensar, do que vão dizer.
OP - Ao que parece é uma situação muito delicada, para dizer o mínimo.
Edith
  - As coisas já estão melhorando. No caso das mães, o amor sempre 
vence, mesmo entre aquelas que passam por grandes dificuldades neste 
processo. Tem mães que tentam suicídio, que começam a beber, que 
precisam ir para o Alcoólatras Anônimos, que entram em depressão 
profunda, somatizam e ficam muito doentes quando descobrem que seus 
filhos são gays ou lésbicas. Como elas amam o filho, com o tempo, 
procuram o nosso grupo, começam a ler sobre o assunto, tiram dúvidas com
 pessoas que se especializaram em diversidade sexual... Mas o 
combustível, a energia que faz esse processo se desenvolver é o amor.
OP - É um caminho, então, que não é fácil para nenhum dos lados envolvidos?
Edith
  - Não é fácil, e é muito semelhante para os filhos e para os pais. Os 
jovens passam até cinco, sete, 10 anos para se aceitarem. E com os pais 
acontece a mesma coisa - com raras exceções. Quando a família está unida
 todos ganham. A dificuldade faz com que a família fique mais unida 
ainda. Um filho gay pode deixar a família desunida ou unir a família 
para sempre. Nós trabalhamos para que a família fique unida para sempre.
 A família se une para resolver a questão que foi considerada um 
problema, mas não é, só tem a aparência de um problema.
OP - A senhora está falando muito em família. Costuma-se dissociar homossexualidade e apego familiar...
Edith
  - Pelo contrário, gays amam suas famílias. Esta é a verdade. A coisa 
que eles mais querem é ser aceitos pelos pais. Eu recebo centenas de 
mensagens de jovens por semana. De jovens que querem que eu os ajude a 
falar com os pais, para que eles os aceitem.
OP - Em que uma relação mãe e filho ganha com esta convivência aberta com a homossexualidade do filho?
Edith
  - Veja bem, não tem coisa melhor que essa relação. A relação afetiva 
mais importante do mundo é a mãe com o filho e vice-versa. Todas as 
relações são importantes, claro, mas a relação com uma mãe é 
fundamental. Mãe é só uma - graças a Deus, até porque ninguém aguentaria
 ter mais de uma não é? (risos). Mas voltando à sua pergunta, por que 
desperdiçar uma relação tão bonita e importante com mentiras? Com uma 
vida escondida? Isso não faz o menor sentido. Esta é a principal razão 
dos ganhos desta convivência.
OP - O título 
de um dos livros que a senhora escreveu é justamente Mãe sempre sabe?. 
Eu lhe pergunto: uma mãe sempre sabe que seu filho é homossexual?
Edith
  - Não acredito que você me perguntou isso (risos). Se eu lhe 
responder, ninguém mais vai precisar ler o livro e assim você atrapalha o
 meu marketing (risos). Eu coloquei a pergunta no título justamente para
 provocar a curiosidade e para meus leitores se perguntarem quando 
terminarem de ler se eles sempre souberam. 
OP - É possível para a mãe de um homossexual aqui no Ceará receber orientação à distância do Grupo de Pais de Homossexuais? 
Edith
  - Sim, é possível. Eu converso com mães do Brasil todo por telefone. 
Se tiver um número de telefone fixo, eu mesmo ligo. Também converso pela
 internet. Elas podem entrar no nosso grupo virtual e vão receber 
orientação e acompanhamento. É um serviço gratuito, o trabalho é 
voluntário. Também converso muito todos os dias com jovens gays em busca
 de aceitação da família. São os meus filhos de coração.
Perfil
Edith
 Modesto é a fundadora do Grupo  de  Pais Homossexuais (GPH). É 
escritora, professora universitária e  pesquisadora, mestra e doutora em
 Semiótica francesa pela USP,  terapeuta, especialista em diversidade 
sexual e questões de gênero. 
Há  20 anos, ela descobriu que 
Marcello, o caçula de seus sete filhos, é  homossexual. Começou então a 
pesquisar sobre diversidade na orientação  sexual na tentativa de 
compreender o universo do filho. Em 1997, fundou,  com apenas três 
outras mães de homossexuais, o embrião do que viria a  ser hoje o GPH. É
 autora dos livros Vidas em arco-íris – Depoimentos  sobre a 
homossexualidade, Mãe sempre sabe? Mitos e verdades sobre pais e  seus 
filhos homossexuais, Entre mulheres - Depoimentos homoafetivos e  
Homossexualidade: Preconceito e Intolerância, sua tese de doutorado.
 
SERVIÇO  
 
Grupo de Pais de Homossexuais (GPH) 
Site: www.gph.org.br 
 
Endereço: Rua Alberto Faria, 835, Alto de Pinheiros, São Paulo/SP
Fone:  (11) 3031 2106 
 
Email:  mães-de-homos@uol.com.br

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