Publicado no Dezanove de Portugal
Por César Monteiro
Uma revisão científica realizada por David Crews, da Universidade do 
Texas e publicada na científica EMBO, sobre a sexualidade nos animais, 
trouxe ideias chave e explicações para algumas perguntas e tenta 
desmoronar alguns preconceitos e dogmas. 
 
A maioria dos animais começam as suas vidas a partir de uma só célula, 
crescem e desenvolvem-se para um dos dois sexos e, posteriormente 
interagem com o sexo oposto para conceber uma nova célula que recomeçará
 o ciclo novamente. Esta equação básica está na base de todos os 
aspectos da sexualidade, ou seja, propriedades específicas, (ou seja, os
 órgãos genitais) evoluíram a fim de atraírem membros do sexo oposto e 
portanto, a reprodução. Isto também sugere que todas as formas de vida 
evoluíram de ancestrais bissexuais. Com isto pretende-se dizer que em 
formas de vida ancestrais, os indivíduos, embora cruzando-se entre si, 
não apresentavam uma diferenciação notória entre macho e fêmea pois as 
células eram praticamente iguais. Apenas mais tarde é que começaram a 
aparecer os espermatozóides e os óvulos. 
De facto, em vários seres vivos mais primitivos isto pode ser 
constatado, quer em termos comportamentais quer em termos físicos. Como 
exemplos temos os animais hermafroditas que podem autofertilizar-se mas 
também copular com outro individuo da própria espécie. Temos também um 
exemplo de bissexualidade numa espécie que evoluiu a partir de outra que
 se reproduz segundo os mecanismos mais comuns (macho vs fêmea). 
Os Cnemidophorus uniparens, são constituídos apenas por répteis fêmeas, e
 que se reproduzem por um mecanismo natural de clonagem (uma vez que os 
ovos geram um individuo igual à mãe pois esta não mistura os seus genes 
com qualquer macho). No entanto, existem entre estas, fêmeas que 
realizam comportamentos copulatórios típicos de macho, demonstrado assim
 uma separação entre “o sexo genital e o sexo cerebral”. 
Em boa verdade, isto não é de todo inesperado. Desde há muito tempo que 
se sabe que as estruturas cerebrais associadas ao comportamento sexual 
têm uma diferenciação independente daquela que ocorre nas estruturas 
genitais. De facto, experimentalmente já foi demonstrado que em 
ratinhos, através de lesões localizadas em certas estruturas cerebrais 
relacionadas com o comportamento sexual ou por indução hormonal, é 
possível fazer com que um macho perca um interesse pelo sexo oposto bem 
como alterar os comportamentos copulatórios dos indivíduos. 
Sabe-se também que no caso dos animais superiores que a determinação 
sexual é conferida geneticamente, ou seja, como no caso dos mamíferos, 
fêmeas XX e machos XY. Apesar de tudo, em animais mais primitivos como 
em muitos peixes, não existem cromossomas sexuais, no entanto continua a
 haver uma segregação de indivíduos para serem machos ou fêmeas. Ou 
seja, nestas espécies existe um potencial genético para desenvolver 
ambos os sexos. Noutros peixes, os indivíduos nascem com um sexo, mas na
 vida adulta, podem sofrer uma metamorfose e mudarem de sexo. No caso 
dos répteis, tais como tartarugas, crocodilos e algumas espécies de 
lagartos podemos verificar esta bipotencialidade genética. Estes, a dada
 altura do seu desenvolvimento embrionário, são muito sensíveis à 
temperatura ambiente a que estão submetidos, e esta, tem um papel 
decisivo na determinação sexual. 
No caso de uma espécie de réptil em particular, o jeco‑leopardo, uma 
temperatura de incubação dos ovos de 26 oC, gera uma ninhada constituída
 apenas por fêmeas. À medida que a temperatura sobe a probabilidade de 
surgirem machos na ninhada aumenta, sendo que a 34oC a ninhada e 
praticamente constituída por machos. 
Em conclusão, é na acção combinada destes factores que temos a respostas
 para o facto de a masculinidade a feminilidade serem apenas pontos 
opostos de um continuum, ou seja, todos nós, somos em última análise 
bissexuais, e serão as acções combinadas das hormonas, genes e ambiente 
que irão determinar posteriormente quer a sexualidade quer a orientação 
sexual.



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