Publicado pelo G1
Faz quase um ano que o sorriso de Maria Tereza chegou para iluminar a
vida dos pais Mailton Alves Albuquerque, 35 anos, e Wilson Alves
Albuquerque, 40. A criança foi o primeiro bebê brasileiro filho de um
casal homoafetivo masculino e concebido através de fertilização in vitro
registrado pela Justiça. A menina faz aniversário dia 29 de janeiro,
mas a festa será no domingo (27). Ao invés de presentes, os convidados
devem levar doações para um abrigo de crianças pobres com deficiência no
Recife. Esse foi o jeito que os empresários arrumaram para despertar o
espírito de solidariedade entre amigos e parentes.
A ONG Lar Rejane Marques será a beneficiada com os donativos. Sem fins
lucrativos, a instituição acolhe crianças com deficiência física e/ou
mental, vítimas de violência doméstica e em situação de vulnerabilidade
social. "Quando começamos a pensar na festa, vimos que Maria Tereza não
precisava de nada. Pensamos, primeiro, em ajudar pessoas que estão
sofrendo com a seca, mas, por indicação, conhecemos o Lar Rejane
Marques, que, por ser uma organização pequena, tem mais dificuldades em
arrumar recursos", falou Mailton.
O casal pediu aos 300 convidados donativos para colaborar com a
manutenção da instituição, como lençóis, toalhas, remédios e leite. "Nós
fomos conhecer o lugar e dói no coração ver crianças jogadas à própria
sorte. É que quando você tem um filho, você vivencia um amor
incondicional e é difícil entender como alguém o abandona, mas, claro,
cada caso é um caso, não podemos julgar os pais delas. Nossa ideia é que
as pessoas conheçam essa realidade e, se acharem por bem, depois
continuem a ajudar o Lar", explicou Wilson.
Atualmente, 16 crianças, de zero a dez anos, estão abrigadas na ONG, que
fica no bairro de Campo Grande. A maior parte foi abandonada pelos
pais. O local funciona apenas por meio de doações. "Precisamos de
alimento, principalmente carne, que nunca vem, fraldas tamanho G e GG,
remédios, sofás, ventiladores e outros eletrodomésticos. A casa precisa
em torno de R$ 50 mil por mês para se manter, por isso doação em
dinheiro também é importante", informou a coordenadora executiva do Lar
Rejane Marques, Rita de Cássia Vasconcelos.
Apenas 20 pessoas trabalham na instituição, em sistema de plantão. Por
isso, o apoio de voluntários é bem-vindo. "O voluntário potencializa
cada ação da casa, levando a criança para um passeio, para um médico,
fazendo um aniversário, além de ajudar na mobilização de recursos e
gestão. Fico feliz com essa ação do casal, pois mostra como a sociedade
está evoluindo, pensando no bem de todos", disse a coordenadora
Dia a dia
A chegada do bebê mudou a rotina do casal, que está junto há 16 anos. O
escritório onde trabalham, na Ilha do Leite, no Recife, precisou
adaptar-se, com brinquedos pelo chão e o berço ao lado das mesas. "A
sensação é que temos uma responsabilidade maior, de cuidar de uma outra
vida. A gente faz tudo com ela, pois queremos que ela nunca se sinta
sozinha. Estamos aprendendo no dia a dia a cuidar dela, é assim com todo
pai de primeira viagem. Hoje, quem manda na gente é Maria Tereza",
brincou Mailton.
A decisão de terem um herdeiro aconteceu há dez anos, quando
estabeleceram uma união estável. Na época, uma resolução do Conselho
Federal de Medicina (CFM), que estava em vigor desde 1992, determinava
que os usuários da técnica de fertilização deveriam ser mulheres em
união estável ou casadas. Em 2010, Mailton fez um intercâmbio no Canadá,
onde conheceu outro casal gay que já tinha três filhos, concebidos
através da técnica.
Interessado pela ideia, em janeiro de 2011 ele recebeu a notícia que
esperava há muito tempo: o CFM mudara a resolução, decidindo que todas
as pessoas capazes poderiam utilizar a técnica. No mesmo mês, os dois
procuraram uma clínica no Recife e começaram a fazer os exames.
Todas as mulheres da família, entre irmãs e primas de Mailton e Wilson,
se prontificaram a ajudá-los. Depois dos testes, ficou decidido que uma
prima de Mailton iria emprestar o útero para gerar a filha do casal. A
família aprovou a iniciativa. Os dois doaram espermatozóides para serem
fecundados com óvulos de um banco de doadoras. Dessa primeira vez, foi
utilizado um óvulo fecundado por Mailton.
Em 2012, foi o juiz Clicério Bezerra quem possibilitou que a certidão de
Maria Tereza tivesse o nome dos dois pais, um caso inédito na época. Os
dois vão providenciar este ano o segundo filho. Wilson é quem vai doar,
desta vez, o material genético. "Nós nunca sofremos nenhum tipo de
preconceito, pelo contrário, muitas pessoas nos reconhecem e parabenizam
pela iniciativa, principalmente heteros. Estamos educando nossa filha
da maneira mais natural possível, para que ela entenda que tem dois pais
e enfrente qualquer dificuldade no futuro, pois o bullying só tem
sucesso quando a pessoa se ofende, senão vira apenas uma piada sem
graça", falou Wilson.
Serviço
Lar Rejane Marques
Rua Esberard, n° 235 - Campo Grande - Recife
Telefone: (81) 3241-4249
Fax: (81) 3212.0009
E-mail: admlarrejanemarques@hotmail.com
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