domingo, 22 de abril de 2012

O Descobrimento do Brasil e a chegada da homofobia!


Por Élio Farias/ Homorrealidade
De um modo geral, sabemos que a homofobia é o sentimento de aversão a qualquer relacionamento homossexual e, consequentemente, a qualquer pessoa que sinta atração ou se relacione com outras do mesmo sexo. Mas quando foi que esse sentimento começou a surgir na história do país?  Quando e como surgiram os casos de rejeição, repressão, ridicularização, condenação ou agressões contra LGBTs?  Considerando algumas pesquisas antropológicas e históricas, podemos afirmar que a homofobia chegou às terras tupiniquins junto com as caravelas de Cabral, a partir do “descobrimento” do Brasil. Se hoje registramos 512 anos (há contradições...) da chegada dos portugueses, de certa forma também registramos o mesmo para a chegada do preconceito de orientação sexual e identidade de gênero.
Antes das Caravelas 
Estudos históricos apontam que homens e mulheres homossexuais já viviam em diversas comunidades indígenas bem antes de a colonização portuguesa começar. Além disso, há muitas as evidências de que a homossexualidade era socialmente aceita entre os índios. As informações estão relatadas na pesquisa intitulada “A Etno História da Homossexualidade na América Latina”, realizada pelo antropólogo baiano Luiz Mott.
As evidências da homossexualidade nesses e em outros povos foram encontradas em esculturas e cerâmicas representando cenas homoeróticas, em mitos conservados na memória oral dos nativos e em relatos dos primeiros cronistas que entraram em contato com essas etnias. Segundo o pesquisador Abelardo Romero, a homossexualidade não apenas já existia na época do descobrimento como já estava presente há séculos na cultura desses povos. 
Ainda segundo Mott, se nos basearmos nas informações dos principais estudos da homossexualidade na américa latina, além de monografias baseadas nas diferentes culturas desta região, podemos constatar a existência de relacionamentos homossexuais ou travestismo em diversas etnias indígenas do Brasil. Relatos dessa ordem envolvem comunidades como Guatós, Banarés, Wai-Wais, Xavantes, Trumais, Tubiras, kaingaigs, Teneteharas, Yanomanis, Mehinakus,Camaiurás,Cubeos e Guaiaquil. Vejam outros casos levantados : 
Tupinambás
Conforme relato do português Gabriel Soares de Souza, esses povos apresentaram tanto a homossexualidade masculina como a feminina. Segundo ele, o "pecado nefando" era bem aceito, sendo que o índio ativo tinha-se por valente, contando o caso como proeza.
Tupinaés
Eram vizinhos dos Tupinambás, mas pareciam evidenciar relacionamentos homossexuais em maior número. Em 1576, o também português Pero de Magalhães de Gândavo relatou que os índios "se entregam ao vício (da sodomia) como se neles não houvera razão de homens".
Guaicurus
Há relatos de travestismo. O viajante Johann Rugendas encontrou um grupo de índios chamados "cudinhos", homens castrados que se vestiam de mulheres e passavam a efetuar tarefas tradicionalmente femininas, como a tecelagem.
Bororós
Segundo Trevisan, os mancebos da etnia recolhiam-se ao baito (ou casa-dos-homens), onde mulheres não podiam ingressar e os homens entregam-se a relações sexuais com naturalidade. Os meninos eram iniciados com o "auxílio" de um homem mais velho. A prática era parecida com o que acontecia na Grécia Antiga. O iniciado comportava-se passivamente durante um período de isolamento e só depois saia para procurar mulher.
Nambiquaras
Não escondiam as relações homossexuais praticadas pelos homens jovens. Pelo contrário, o antropólogo Claude Lévi-Strauss verificou que essas mereciam publicidade muito maior que as relações entre homens e mulheres. No livro Tristes Trópicos, Strauss afirma que essas relações só eram permitidas entre primos cruzados ou cunhados e que não era raro ver dois ou três homens, casados e pais de família, “passeando à noite carinhosamente abraçados".
Coerunas
Alguns relatos apontam que pajés, em sua medicina indígena, utilizavam comumente relacionamentos sexuais com seus enfermos, inclusive com intercurso anal, como forma de cura. Entre os xamãs, os conhecimentos curativos eram passados do pajé mais velho aos seus alunos pela cópula carnal, onde o aluno se entrega ao mais velho. 
Com a chegada das Naus 
Já influenciados pela cultura cristã da época, não foi à toa que os navegadores se surpreenderam com o comportamento liberal dos nativos. O antropólogo alemão Von Martius, um dos mais importantes pesquisadores da história indígena do Brasil, relatou o espanto dos portugueses com “a antropofagia e a sodomia” dos índios. 
Porém, mesmo aparentemente contrários à tal sodomia, alguns portugueses demonstraram desejos homossexuais ao vislumbrarem um verdadeiro paraíso sexual do outro lado do oceano. Segundo o historiador Amílcar Torrão Filho, muitos navegadores e colonos até preferiam os índios para suas práticas sexuais no lugar das índias. E não seria engano afirmar que o pau-brasil foi um verdadeiro sucesso....
Foi assim, temendo um “descontrole” sexual que prejudicasse sua dominação, que Portugal resolveu importar o nada divino “santo ofício da Inquisição”, nos séculos XVI e XVII. O antropólogo Mott confirma que, desse modo, a dominação portuguesa acabou trazendo consigo as ordenações da igreja, que classificava a homossexualidade como o "mais torpe, sujo e desonesto pecado".  
Em 1532, no regimento de instalação das capitanias, o rei de Portugal acabou outorgando autoridade aos capitães-mor para condenar à morte, sem necessidade de autorização da Metrópole, todos os culpados pelo crime de sodomia. Era o início o massacre... 
A criminalização, as torturas e as mortes geradas pela ordem portuguesa não chegaram a impedir que os gays da época fizessem sexo com seus semelhantes, conforme atestam documentos preservados no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, em Portugal. Homossexuais já existiam antes da colonização e continuaram existindo depois dela. Mas foi assim que a homofobia, pouco a pouco, foi se instaurando em nosso país e, ainda hoje, continua matando centenas de lésbicas, gays, travestis e transexuais...  
Deus é testemunha!

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