Por Élio Farias/ Homorrealidade 
De um modo geral, sabemos que a homofobia é o sentimento de aversão a 
qualquer relacionamento homossexual e, consequentemente, a qualquer 
pessoa que sinta atração ou se relacione com outras do mesmo sexo. Mas 
quando foi que esse sentimento começou a surgir na história do país?  
Quando e como surgiram os casos de rejeição, repressão, ridicularização,
 condenação ou agressões contra LGBTs?  Considerando algumas pesquisas 
antropológicas e históricas, podemos afirmar que a homofobia chegou às 
terras tupiniquins junto com as caravelas de Cabral, a partir do 
“descobrimento” do Brasil. Se hoje registramos 512 anos 
(há contradições...) da chegada dos portugueses, de certa forma também 
registramos o mesmo para a chegada do preconceito de orientação sexual e
 identidade de gênero. 
Antes das Caravelas  
Estudos históricos apontam que homens e mulheres homossexuais já viviam 
em diversas comunidades indígenas bem antes de a colonização portuguesa 
começar. Além disso, há muitas as evidências de que a homossexualidade 
era socialmente aceita entre os índios. As informações estão relatadas 
na pesquisa intitulada “A Etno História da Homossexualidade na América 
Latina”, realizada pelo antropólogo baiano Luiz Mott. 
As evidências da homossexualidade nesses e em outros povos foram 
encontradas em esculturas e cerâmicas representando cenas homoeróticas, 
em mitos conservados na memória oral dos nativos e em relatos dos 
primeiros cronistas que entraram em contato com essas etnias. Segundo o 
pesquisador Abelardo Romero, a homossexualidade não apenas já existia na
 época do descobrimento como já estava presente há séculos na cultura 
desses povos.  
Ainda segundo Mott, se nos basearmos nas informações dos principais 
estudos da homossexualidade na américa latina,  além de monografias 
baseadas nas diferentes culturas desta região, podemos constatar a 
existência de relacionamentos homossexuais ou travestismo em diversas 
etnias indígenas do Brasil.  Relatos dessa ordem envolvem comunidades 
como Guatós, Banarés, Wai-Wais, Xavantes, Trumais, Tubiras, kaingaigs, 
Teneteharas, Yanomanis, Mehinakus,Camaiurás,Cubeos e Guaiaquil. Vejam 
outros casos levantados :  
Tupinambás 
Conforme relato do português Gabriel Soares de Souza, esses povos 
apresentaram tanto a homossexualidade masculina como a feminina. Segundo
 ele, o "pecado nefando" era bem aceito, sendo que o índio ativo 
tinha-se por valente, contando o caso como proeza. 
Tupinaés 
Eram vizinhos dos Tupinambás, mas pareciam evidenciar relacionamentos 
homossexuais em maior número. Em 1576, o também português Pero de 
Magalhães de Gândavo relatou que os índios "se entregam ao vício (da 
sodomia) como se neles não houvera razão de homens". 
Guaicurus 
Há relatos de travestismo. O viajante Johann Rugendas encontrou um grupo
 de índios chamados "cudinhos", homens castrados que se vestiam de 
mulheres e passavam a efetuar tarefas tradicionalmente femininas, como a
 tecelagem. 
Bororós 
Segundo Trevisan, os mancebos da etnia recolhiam-se ao baito (ou 
casa-dos-homens), onde mulheres não podiam ingressar e os homens 
entregam-se a relações sexuais com naturalidade. Os meninos eram 
iniciados com o "auxílio" de um homem mais velho.  A prática era 
parecida com o que acontecia na Grécia Antiga. O iniciado comportava-se 
passivamente durante um período de isolamento e só depois saia para 
procurar mulher. 
Nambiquaras 
Não escondiam as relações homossexuais praticadas pelos homens jovens. 
Pelo contrário, o antropólogo Claude Lévi-Strauss verificou que essas 
mereciam publicidade muito maior que as relações entre homens e 
mulheres. No livro Tristes Trópicos, Strauss afirma que essas relações 
só eram permitidas entre primos cruzados ou cunhados e que não era raro 
ver dois ou três homens, casados e pais de família, “passeando à noite 
carinhosamente abraçados". 
Coerunas 
Alguns relatos apontam que pajés, em sua medicina indígena, utilizavam 
comumente relacionamentos sexuais com seus enfermos, inclusive com 
intercurso anal, como forma de cura. Entre os xamãs, os conhecimentos 
curativos eram passados do pajé mais velho aos seus alunos pela cópula 
carnal, onde o aluno se entrega ao mais velho.  
Com a chegada das Naus  
Já influenciados pela cultura cristã da época, não foi à toa que os 
navegadores se surpreenderam com o comportamento liberal dos nativos. O 
antropólogo alemão Von Martius, um dos mais importantes pesquisadores da
 história indígena do Brasil, relatou o espanto dos portugueses com “a 
antropofagia e  a sodomia” dos índios.  
Porém, mesmo aparentemente contrários à tal sodomia, alguns portugueses 
demonstraram desejos homossexuais ao vislumbrarem um verdadeiro paraíso 
sexual do outro lado do oceano. Segundo o historiador Amílcar Torrão 
Filho, muitos navegadores e colonos até preferiam os índios para suas 
práticas sexuais no lugar das índias. E não seria engano afirmar que o 
pau-brasil foi um verdadeiro sucesso.... 
Foi assim, temendo um “descontrole” sexual que prejudicasse sua 
dominação, que Portugal resolveu importar o nada divino “santo ofício da
 Inquisição”, nos séculos XVI e XVII. O antropólogo Mott confirma que, 
desse modo, a dominação portuguesa acabou trazendo consigo as ordenações
 da igreja, que classificava a homossexualidade como o "mais torpe, sujo
 e desonesto pecado".   
Em 1532, no regimento de instalação das capitanias, o rei de Portugal 
acabou outorgando autoridade aos capitães-mor para condenar à morte, sem
 necessidade de autorização da Metrópole, todos os culpados pelo crime 
de sodomia. Era o início o massacre...  
A criminalização, as torturas e as mortes geradas pela ordem portuguesa 
não chegaram a impedir que os gays da época fizessem sexo com seus 
semelhantes, conforme atestam documentos preservados no Arquivo Nacional
 da Torre do Tombo, em Portugal. Homossexuais já existiam antes da 
colonização e continuaram existindo depois dela. Mas foi assim que a 
homofobia, pouco a pouco, foi se instaurando em nosso país e, ainda 
hoje, continua matando centenas de lésbicas, gays, travestis e 
transexuais...   
Deus é testemunha! 




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