Publicado no G1
Com informações da BBC
Dica de Augusto Martins
Dica de Augusto Martins
Em alguns aspectos, país faz jus à imagem liberal, mas ataques homofóbicos levantam questões sobre limites da tolerância.
Um estrangeiro que começar uma visita ao Brasil pela praia de Ipanema
vai confirmar em primeira mão a imagem que o país tem no exterior de
grande abertura e diversidade em relação a atitudes sexuais.
Não há nudismo, mas os trajes de banho são conhecidos no mundo inteiro
pelo tamanho reduzido, e casais do mesmo sexo têm seu lugar ao sol,
sobretudo no trecho em frente à Rua Farme de Amoedo, onde as bandeiras
arco-íris - o símbolo internacional do orgulho gay - tremulam contra o
céu azul.
Mas a série de ataques de aparente motivação homofóbica que ganharam
destaque na mídia no último ano chamaram a atenção para o fato de que o
preconceito e a violência contra homossexuais coexiste com os aspectos
associados à diversidade da cultura brasileira.
O relatório sobre violência homofóbica no Brasil - o primeiro do tipo na
América Latina - divulgado recentemente pela Secretaria Nacional de
Direitos Humanos revela que os órgãos federais receberam em 2011 uma
média de 19 denúncias por dia de discriminação ou violência contra
homossexuais.
'Não é um país tão liberal como parece à primeira vista,', diz Miguel
Macedo, presidente da ONG Diversidade Nacional, de Niterói (RJ). 'Claro
que é bom poder vir à praia com o namorado e ter esse tipo de liberdade,
mas aí você vira uma esquina e pode levar uma 'lampadada' na cabeça',
diz ele.
A 'lampadada' de que ele fala é uma referência a um ataque homofóbico
ocorrido na Avenida Paulista, em São Paulo, em novembro do ano passado. A
ação foi perpetrada por um grupo de cinco jovens de classe média contra
pessoas que eles julgavam ser homossexuais.
As imagens - capturadas por câmeras de segurança - de um jovem
arrebentando uma longa lâmpada fluorescente contra a cabeça de outro
rapaz sem motivo aparente chocaram o país e chamaram a atenção para o
tema da violência homofóbica.
Outro caso que virou notícia (em julho deste ano) foi o dos dois irmãos
gêmeos da cidade de Camaçari (BA) atacados por um grupo de oito homens
que os confundiram com um casal homossexual, porque estavam abraçados.
Um dos irmãos morreu por conta dos ferimentos e outro foi levado para o
hospital com afundamento na face.
Alvos fáceis
'Os homossexuais brasileiros vêm se sentindo mais livres para revelar à
sociedade sua orientação sexual e isso os torna alvos mais fáceis da
homofobia', diz a professora do departamento de medicina social da Santa
Casa Hospital Universitário, Maria Amélia Veras. 'Não acho que a
homofobia esteja necessariamente crescendo, mas acho que vem se tornando
mais visível.'
A médica foi uma das coordenadoras de um estudo realizado com 'homens
que fazem sexo com homens', no centro de São Paulo - particularmente em
áreas de prostituição masculina. O objetivo principal da pesquisa era
descobrir mais sobre a propagação do vírus HIV entre o grupo, mas os
pesquisadores decidiram incluir algumas perguntas para avaliar o nível
de homofobia de que essas pessoas são vítimas.
'Cerca de 70% dos entrevistados relataram ter sido vítimas de algum tipo
de preconceito ou estigmatização. E, pior ainda, 35% relataram a
discriminação na escola e cerca de 20% se sentiram discriminados pela
polícia', acrescenta Veras.
Para lideranças gays brasileiras, uma das prioridades agora é a
aprovação do Projeto de Lei 122 (PLC122), que define homofobia como um
crime, como já é o caso da discriminação por motivos de cor raça, etnia,
nacionalidade ou religião.
O projeto foi aprovado em primeira votação na Câmara dos Deputados em
2006, mas está parado na comissão de Constituição e Justiça do Senado
desde então - enfrentando forte resistência da bancada conservadora.
Opositores
'A aprovação do PL122 na Câmara dos Deputados só aconteceu por uma
fraude. O projeto entrou na pauta de votação numa quinta-feira no fim do
dia. E só vai conseguir ser aprovado no Senado se os homossexuais
promoverem outra fraude', diz o deputado federal e capitão reformado
Jair Bolsonaro, o mais virulento opositor das iniciativas relativas aos
direitos dos homossexuais na política brasileira.
Bolsonaro diz que a legislação anti-homofobia transformaria gays e
lésbicas no Brasil em uma 'classe especial de cidadãos'. 'Por exemplo,
se um comerciante não quiser vender algo a um cliente gay, porque ele
tem nome sujo, a loja pode acabar denunciada por homofobia', diz o
deputado.
Mas a mais forte resistência a leis ampliando os direitos da comunidade
gay vem das igrejas conservadoras, sobretudo evangélicas e
neopentecostais. 'Este projeto de lei anti-homofobia é um atentado
flagrante à liberdade de expressão', diz o pastor Silas Malafaia.
'Há uma diferença grande entre criticar um estilo de vida e praticar ou
incentivar a violência', diz o pregador, que foi processado por
ativistas gays por seus discursos, mas até agora conseguiu ganhar as
causas.
Malafaia afirma que não há homofobia no Brasil e que tal ideia só foi
criada porque 'há muitos gays nos meios de comunicação e na cultura
popular que querem alterar o comportamento das pessoas'.
O desconforto que os homossexuais sentiam em igrejas tradicionais foi o
motivo para que gays evangélicos fundassem, seis anos atrás, uma igreja
'inclusiva' no Brasil.
Na Igreja Contemporânea, os cultos se parecem exatamente com o de outras
igrejas evangélicas - com muitos cânticos e louvação exaltada - mas com
a diferença de que a grande maioria dos frequentadores são gays.
'Igrejas evangélicas tradicionais dizem que estão lá para nos acolher,
mas na verdade eles apenas olham de cima abaixo, nos julgam e agem de
forma muito preconceituosa', diz o pastor Elias Barbosa. 'É por isso que
essa igreja foi criada: aqui nós homossexuais podemos louvar a Deus
como somos, sem disfarces.'
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