Publicado no G1
Kátia Tapety foi a vereadora mais votada de Colônia (PI) por três vezes.
Quando criança, os pais a impediram de sair de casa e frequentar escola.
Não deixa de ser curioso o fato de que o primeiro travesti eleito para
um cargo político no Brasil nasceu, foi criado e fez carreira em
Colônia, cidadezinha com cerca de oito mil habitantes no sertão
piauiense. Kátia Tapety, que nasceu José Nogueira Tapety Sobrinho, é a
protagonista do documentário “Kátia”, que foi exibido nessa quarta-feira
(19) na mostra competitiva do 45º Festival de Brasília do Cinema
Brasileiro.
Integrante de uma tradicional família de políticos do Piauí, Kátia foi
proibida de sair de casa durante a infância e parte da adolescência. Ela
foi a única de nove filhos que não recebeu educação formal e apanhava
até quando ia com a mãe para a igreja. Para a diretora Karla Holanda,
esse período de reclusão foi fundamental na formação de Kátia.
“Uma das coisas que mais me chamou a atenção foi o respeito, a dignidade
que ela conquistou, especialmente vindo de um lugar inesperado, o
sertão do Piauí. O mérito todo está na Kátia, no jeito que ela se faz
respeitar. Acho que ela conseguiu criar estratégias para sobreviver”,
opina Karla.
Com a morte do pai, Kátia se libertou. Ela casou e adotou três filhos,
um dos quais morreu há cerca de quatro anos. Em 1992, se candidatou pela
primeira vez ao cargo de vereadora. Não só ganhou, como foi a mais bem
votada de Colônia do Piauí – feito que repetiu nas eleições de 1996 e de
2000.
Piauiense radicada no Rio de Janeiro, a diretora conheceu Kátia em 2008,
por meio de notícias em jornais e na internet, e diz que logo se
interessou pela personagem.
De acordo com Karla, o objetivo do filme nunca foi fazer uma biografia
de Kátia, mas sim mostrar a força da mulher que antes era homem.
“No início, o que me chamou a atenção foi isso dela ser a primeira
travesti eleita para um cargo político, mas isso logo ficou em segundo
plano. E percebi que me chamava muito a atenção a forma como ela se fez
respeitar (...) Ela tem uma riqueza muito grande e lida com o mundo de
uma forma muito dela, muito prática, sem rodeios.”
A diretora afirma que, apesar do estigma de ser a primeira travesti com
carreira política do país, Kátia nunca ficou reconhecida por defender
apenas projetos voltados para o público LGBT.
Atualmente, Kátia está separada do companheiro com quem viveu por quase
20 anos. Ela, que também já foi vice-prefeita de Colônia do Piauí, não
concorre a nenhum cargo nas eleições deste ano, mas acompanhou a sessão
dessa quarta no Festival de Brasília.
“A política para a Kátia não precisa nem de cargo, ela faz política o
tempo inteiro. Uma política mais assistencialista, porque as
necessidades [ da população de Colônia do Piauí] são tão elementares que
podem ser resolvidas com um tipo de ajuda mais simples, como levar uma
pessoa ao médico, agendar uma consulta, ajudar um casal a tirar a
certidão de nascimento do filho ou questões de transporte, que é muito
ruim, falho e caro para população que vive da agricultura no sertão.”
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