Publicado pela Rede Brasil Atual
O uso do nome social é determinante para travestis e transexuais. Sem
isso, são discriminados em todos os ambientes e circunstâncias, desde a
hora da chamada na sala de aula até ocasiões públicas, como em
consultórios médicos, lojas, entre outros momentos em que são tratadas
pelo nome de registro, com o qual não se identificam. Raras iniciativas
têm reduzido esse constrangimento.
O estado de São Paulo, por exemplo, por meio do Decreto 55.588, de 2010,
prevê o tratamento de travestis e transexuais pelo nome por eles
escolhido para usar socialmente de acordo com sua identidade de gênero.
Mas a medida restringe-se à administração pública estadual direta e
indireta. No entanto, vem do governo do Rio Grande do Sul algo que pode
indicar a redução da marginalização desse grupo: a Carteira de Nome
Social (CNS), que começou a ser emitida em 16 de agosto passado, por
meio da qual travestis e transexuais poderão ser identificados nos
serviços públicos do estado gaúcho. Com sorte, a sociedade em geral vai
entender e aceitar também.
A carteira, elaborada pela Secretaria de Segurança Pública em parceria
com a Secretaria de Justiça e dos Direitos Humanos, dentro do programa
RS sem Homofobia, é emitida pelo Instituto Geral de Perícias (IGP) com o
mesmo método da Carteira de Identidade. Até hoje (18), foram emitidas
119 carteiras. No Departamento de Identificação, em Porto Alegre, houve
100 solicitações. No Posto de Identificação de Caxias do Sul, houve
cinco. No de Pelotas, duas. Em Santo Ângelo, uma, e no Presídio Central,
11.
A criação da carteira social estava prevista no Decreto 48.118/2011,
assinado pelo governador Tarso Genro (PT). Em 17 de maio passado, Dia
Estadual de Enfrentamento à Homofobia, o governador entregou
simbolicamente a primeira CNS à travesti Simone Rodrigues. Na data
também foi criado o Comitê Gestor dos Direitos Humanos, para cuidar,
entre outros, dos direitos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e
transexuais (LGBT).
O secretário da Segurança Pública do estado, Airton Michels, explicou
que a carteira social remete ao RG, portanto, a pessoa pode usá-la
porque vai ser imediatamente identificada, já que possui a mesma
numeração. Ele explica que o uso da CNS não exclui a necessidade de
portar o RG, mas é uma garantia de respeito ao nome social.
"É claro que a carteira tem seus limites. Em um cartório, por exemplo, a
pessoa pode até se identificar com a carteira social e ser tratada pelo
nome social, mas o contrato, por exemplo, tem de ser feito com o nome
de registro. A mudança pode valer para o tratamento desse grupo na
escola, na delegacia, até numa loja ou em qualquer estabelecimento
privado, embora não tenhamos como forçá-los a aceitar", esclareceu
Michels. Mas, para ele, com um mínimo de sensibilidade o atendente vai
confrontar a carteira social com o RG e vai tratar a pessoa por seu nome
social.
"O decreto prevê aceitação na Administração Pública e no Poder
Executivo, mas estamos negociando com o Poder Judiciário, e a discussão
está evoluindo. Porém, o Judiciário está muito sensível a essa questão",
disse o secretário. Ele afirmou que os policiais já começam a ser
preparados para aprender a lidar com a questão e a respeitar a validade
do documento. "Este ano vamos capacitar alguns policiais em algumas
delegacias. Os novos policiais militares já recebem informações nesse
sentido, mas isso carece de mais capacitação", admitiu. O estado tem 6
mil policiais civis e 24 mil policiais militares.
"Não é de um dia pro outro, mas à medida que a mídia divulgue e que
fique claro que a Secretaria de Segurança Pública adota esse sistema, as
coisas vão mudar", disse Michels, acrescentando que este é apenas o
início para que o preconceito e a intolerância sejam extirpados do
estado gaúcho.
A advogada Maria Berenice Dias, especialista em direito homoafetivo,
destacou a importância da iniciativa. "A ideia é levar a aceitação a
todas as autoridades públicas", disse. A ex-desembargadora lembrou que
travestis e transexuais de outros estados também podem usufruir desse
benefício. É preciso solicitar Carteira de Identidade no mesmo pedido da
CNS.
"Esse é um grupo marginalizado, sofre desde cedo com a expulsão de casa,
a perda de convívio familiar, sofre humilhações na escola e
dificuldades no mercado de trabalho", disse Berenice. Ela defende a
existência de uma lei federal que combata a homofobia e garanta
direitos, como o uso do nome social.
Como pedir
Segundo a Secretaria de Segurança Pública, desde segunda-feira (17), os
Postos de Identificação Regionais de Santana do Livramento, Caxias do
Sul, Pelotas, Passo Fundo, Santa Maria, Santo Ângelo, Novo Hamburgo,
Osório e Rio Grande passaram a receber encaminhamentos para a Carteira
de Nome Social. A emissão do documento destinado a travestis e
transexuais começou em Porto Alegre no dia 16 agosto.
Para solicitar a CNS são necessários certidão original, conforme o
estado civil, ou a Carteira de Identidade, em bom estado de conservação e
expedida no Rio Grande do Sul. A primeira via será gratuita e a segunda
via custará R$ 45,50, mesmo preço da Carteira de Identidade. A CNS terá
prenome, foto, assinatura e número do RG.
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