Por Silmara Conchão para o Repórter Diário
Dica de Augusto Martins
Em minha pesquisa realizada em Santo André sobre sexualidade foi
notável as opiniões divergentes sobre o tema num grupo de jovens. Apesar
de alguns afirmarem não ter preconceito viu-se nitidamente a
contradição quando surgiram expressões do tipo: “eu não tenho
preconceito, mas não ando com gay, não converso, não critico e não tenho
amizade” ou “se eu vejo, não vou ficar xingando, saio de perto”.
Observou-se maior tolerância das moças frente ao tema, que com mais
tranquilidade disseram ter amizades com garotas e garotos gays. Em tom
maduro, afirmaram a importância das pessoas assumirem primeiro para si
sua identidade: “Eu acho que se você é gay, você tem de ser o que é e se
aceitar”.
As reações discriminatórias foram maiores entre os rapazes, contudo,
não se pode afirmar que as opiniões são imutáveis. Por toda a vida
pensarão desta forma. A presença de gays nos espaços públicos parece
desafiar a reputação do “macho” que se sente ofendido diante de dois
homens namorando.
Indignados, alguns rapazes disseram que hoje em dia tem gay em todo o
canto. Na televisão, na escola, no metrô, nas ruas, no trabalho.
Afirmam que a televisão teve papel fundamental para que gays fossem para
as ruas como estão hoje. E com isto “se as crianças virem homem com
homem ficam induzidas”. Para alguns, o fato seria ótima justificativa
para que homossexuais não namorassem em locais públicos.
A discriminação contra homossexuais ocorre, em muitas vezes, de forma
velada, por meio de referências preconceituosas e pejorativas com o
intuito de humilhar, discriminar, ofender, ignorar, isolar e ameaçar.
Decorre dessa situação, para adolescentes homossexuais, uma dificuldade
imensa em como administrar o estigma social. O constrangimento, produto
de nossa educação machista, modula o modo de administrar sua identidade
sexual. Uns assumem publicamente a existência do parceiro do mesmo sexo,
outros tentam disfarçar e se esconder. Em ambas as situações, tenham
certeza, há muita dor e sofrimento.
Mesmo assim, na pesquisa houve uma declaração corajosa de um dos
rapazes que revelou no grupo sua bissexualidade. Namora e frequenta
boate gay com a namorada, e se diz a favor da felicidade das pessoas,
pois, isto é o que importa e que ninguém, segundo ele, tem que obedecer a
“dogmas religiosos”, “tem sim é que buscar suas formas de sentir prazer
e viver coisas novas”.
Embora vivamos numa sociedade que ainda insiste em nos ensinar que a
heterossexualidade é a mais natural, correta e até mesmo a única maneira
de nos relacionarmos afetiva e sexualmente, na vida real vemos que as
práticas são outras e o debate sobre a afirmação da homossexualidade
está em curso.
O debate é pautado sobre um clima de crescente liberalização dos
costumes associados a estilos de vida diversos que vêm se mostrando a
cada dia. Ao mesmo tempo, o conservadorismo tem afiado suas garras para
manter a homossexualidade no campo da promiscuidade, doença, do desvio
de comportamento, feio, pecado, e se mostra violento com reações que
discrimina, humilha e mata. Direitos humanos, sexuais e reprodutivos são
para toda gente, sem distinção. Está na hora de repensarmos valores e o
nosso papel na luta contra qualquer tipo de violência.
Silmara Conchão é socióloga, professora da Faculdade de Medicina do ABC e autora do livro ‘Masculino e Feminino, a primeira vez’
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