domingo, 6 de maio de 2012

Rio terá cerimônia recorde de união homoafetiva com 70 casais

Visto no O Globo
Há exatamente um ano o Supremo Tribunal Federal (STF) reconhecia a legalidade da união estável entre pessoas do mesmo sexo. A decisão foi unânime entre os ministros do tribunal e o último voto coube ao então presidente da Corte Cezar Peluso, que considerou o julgamento um marco histórico e ponto de partida para novas conquistas. Era a primeira vez que o Supremo julgava se a união entre pessoas do mesmo sexo poderia ser enquadrada no regime jurídico de união estável. Para comemorar um ano da conquista, o governo do estado do Rio, em parceria com o Tribunal de Justiça do Rio, vai promover no próximo dia 30 de junho a maior cerimônia coletiva de união homoafetiva já realizada no mundo, segundo os organizadores.
Ao todo, 70 casais homossexuais poderão legalizar sua situação perante a Justiça e, em alguns casos, com os custos bancados pelo poder público que, através do Centro de Referência LGBT do Rio, orienta e informa a respeito da documentação exigida e de todos os trâmites legais. A cerimônia acontecerá no auditório do TJ e terá direito a bolo para os convidados. Ano passado uma cerimônia similar aconteceu em plena gare da Central do Brasil e celebrou a união de 43 casais homossexuais. Os casais interessados deverão se inscrever através do Disk Cidadania LGBT (0800 0234567) até o dia 30 de maio.
Para o novo presidente do STF, ministro Carlos Ayres Britto, na prática, a decisão viabilizou os direitos dos cidadãos, como pensão em caso de morte do companheiro, herança e adoção.
- A decisão do STF, reconhecendo a igualdade de direitos entre os casais heteroafetivos e os parceiros homoafetivos, confirma que o valor do pluralismo é rechaçante do desvalor do preconceito. Confirma a verdade científica de que a nossa Constituição Federal é humanista e por isso mesmo civilizada. Somos um país juridicamente primeiro-mundista - afirmou Ayres Britto ao GLOBO.
Para o superintendente de Direitos Individuais, Coletivos e Difusos do Rio de Janeiro, Claudio Nascimento, responsável pela organização da cerimônia, de um ano para cá, com a decisão do STF, houve muitos avanços e ajudou a melhorar o combate ao preconceito como um todo.
- A decisão da Suprema Corte brasileira refletiu em várias áreas. Antes, quando se falava em família, logo se pensava numa família heterossexual; hoje é necessário que se inclua a família até então considerada fora dos padrões convencionais. Já existem casos, como em Belford Roxo, na Baixada Fluminense, em que famílias formadas por casais homossexuais que recebem o benefício do Bolsa Família.
Já o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Tony Reis, considera a decisão uma vitória e diz que neste último ano muita coisa melhorou, a começar pela esperança no princípio da igualdade e da liberdade.
- Hoje podemos dizer que temos justiça no país - reconhece.
Por outro lado, diz ele, a decisão fez com que setores retrógrados também se organizassem e as agressões estão mais escandalosas.
- Eles se organizaram de tal forma que muitas vezes chegam a nos acuar. Os conservadores homofóbicos saíram do armário.
Em todo o Brasil são 64 mil casais homossexuais
A decisão do STF fez com que um maior número de casais do mesmo sexo procurasse os cartórios para poderem legalizar sua situação. De acordo com os dados do último censo do IBGE, o Brasil tem 64 mil casais homossexuais, número que Claudio Nascimento contesta por acreditar ser bem maior, uma vez que nem todos declaram sua condição.
- Hoje os gays sabem que se quiserem ter uma união afetiva podem legalizar esta união. Isso dá segurança jurídica e permite o acesso aos benefícios sociais que eventualmente um dos companheiros tenha em seus trabalhos – diz Nascimento.
Para o presidente da ABGLT, Tony Reis, a decisão do STF mudou muito a situação dos homossexuais no Brasil.
- Até então nós vivíamos uma situação de ilegalidade, de falta de reconhecimento. Vivíamos num processo de cidadania de segunda classe - afirma.
Em relação ao aumento ou diminuição da agressão aos homossexuais, ainda não há dados oficiais para análises, pois nunca houve um levantamento a respeito desses casos. Somente o estado do Rio tem dados oficiais, tanto no setor de atendimento na área de secretaria de assistência social, com os atendimentos feitos no Centro de Referência LGBT, ou mesmo nas delegacias de polícia, onde os registros de ocorrência já contam com o quesito homofobia. A ABGLT não tem dados oficiais.
- Em dois anos houve uma diminuição dos casos de agressão contra homossexuais no Rio de Janeiro, mas isso não significa uma diminuição crescente, até porque, na prática, esses dois anos são considerados o marco zero desta análise – completa Nascimento.
Marinha ainda não reconhece estado civil de gays como casados
João Batista Pereira da Silva, cabo reformado da Marinha, é o primeiro militar brasileiro que se casou com um companheiro do mesmo sexo. Marido de Claudio Nascimento, João diz que a decisão do STF não gerou prejuízo a ninguém.
- A situação não mudou nada para quem é heterossexual, mas para os homossexuais foi um avanço e tanto.
Pouco menos de um mês antes do julgamento na Suprema Corte, ele e Nascimento entraram com processo na Marinha do Brasil para que lhes fosse concedido o direito de registro da união no documento militar de identidade. O processo demorou quase sete meses até que a Marinha reconhecesse a união estável dos dois. O próximo passo é conseguir o reconhecimento da mudança de união estável para a mudança de estado civil. Desta forma, na identidade militar não constará mais o estado civil como solteiro, mas sim, casado. O requerimento já está sob análise desde setembro.
- Em geral este prazo é de 90 dias. Até então aceitaram a união civil, mas não reconheceram a certidão de casamento – explica Silva.
A Marinha alega que ainda não tem resposta da Diretoria de Pessoal Militar (DPMM), mesmo que todo o processo deles esteja amparado pela lei.

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