Visto no Jornal do Brasil
Um ano após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceu a
união estável homoafetiva, o foco da luta da comunidade LGBT (lésbicas,
gays, bissexuais e transexuais) se voltou para a questão do casamento
civil. Segundo estimativas da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e
Transgêneros (ABGLT), ao menos 100 casais conseguiram a conversão. No
entanto, a possibilidade varia de acordo com o Estado, já que, em
teoria, só é possível conseguir o casamento - em alguns casos até mesmo a
união estável -, mediante recurso judicial.
No final de 2011 uma decisão, deste vez do Superior Tribunal de Justiça
(STJ), autorizou o casamento civil de um casal de mulheres. A partir daí
alguns cartórios passaram a fornecer a certidão sem a necessidade de
recurso judicial, recomendação feita também por alguns tribunais de
Justiça, como foi o caso do alagoano. Em Porto Alegre (RS) isso já
acontece desde dezembro e 11 casais conseguiram o documento.
Em São Paulo, segundo levantamento do Colégio Notarial foram realizadas
720 uniões estáveis entre maio de 2011 e maio deste ano. No entanto, em
alguns dos cartórios o número de contratos caiu se comparado com números
anteriores aos da decisão do STF.
No entanto, para a comunidade LGBT, apesar das conquistas, tanto a união
estável como a possibilidade de casamento devem ser direitos e não
apenas decisões judiciais. Quem levanta a bandeira da Proposta de Emenda
à Constituição (PEC) do Casamento Igualitário no Congresso é o deputado
federal Jean Wyllys (Psol-RJ). Das 171 assinaturas necessárias para a
tramitação da proposta, ele já conseguiu mais de 110.
O texto propõem mudanças no artigo 226 da Constituição Federal,
acrescentando que o casamento de pessoas do mesmo sexo terá o mesmo
valor do tradicional, além de reconhecer a união como entidade familiar.
"Ainda que eu ache, por demais relevante a decisão do STF, ela não é
suficiente, porque não é direito (...) A PEC do casamento civil vem
nesse sentido, de garantir esses direitos como lei".
Nem todos os juízes aceitam a ideia da união ou casamento de pessoas do
mesmo sexo, rejeição atribuída a conceitos baseados em fundamentalismo
religioso. O próprio presidente da ABGLT, Toni Reis, foi um dos que não
conseguiu a certidão de casamento.
"Eu infelizmente não consegui, com o meu companheiro com quem eu convivo
há 22 anos, mas com certeza vou conseguir até porque já tem uma decisão
no STJ favorável", disse o ativista que cria com seu companheiro um
menino de 11 anos e espera pela chegada de mais uma menina, Maria Alice,
para compor sua família. "A caminha dela já está pronta (...) vamos
constituir nossa família, da nossa forma, e não queremos destruir a
família de ninguém", disse.
Luiz André Resende Souza Moresi e José Sérgio Souza Moresi foram os
primeiros a conseguirem o casamento civil, em uma cerimônia realizada no
dia 28 de junho do ano passado na cidade de Jacareí, interior de São
Paulo. Luiz diz que a maior mudança após o casamento foi o sentimento de
família. "No nosso caso era muito simbólico que a gente adotasse o nome
um do outro, já que se tratou do primeiro no Brasil, eu adotei o Souza
do Sergio e ele adotou o Moresi (...) a partir daquele momento estava
nascendo a família Souza Moresi".
Fundamentalismo religioso
Para aqueles que lutam para que os homossexuais tenham os mesmos
direitos dos heterossexuais, após a decisão do STF, a sociedade se deu
conta de que não se tratavam de privilégios, mas sim de igualdade de
direitos, além de diminuir a rejeição a medida que novas uniões estáveis
ou casamentos surgiam. No entanto, todos reclamam da perseguição de
grupos religiosos, que eles denominam de "fundamentalistas".
Moresi diz que logo após o casamento, a prefeitura de Jacareí sucumbiu à
pressão de setores conservadores e retirou o apoio que possibilitaria a
realização da segunda para gay da cidade. Ele diz ainda que hoje recebe
várias mensagens por e-mail de pessoas contrárias ao seu
relacionamento. "Ignoro. Isso só me dá mais vontade de continuar lutando
pela aprovação do casamento civil igualitário e de combate à
discriminação".
O deputado Jean Wyllys diz que não consegue dialogar com esses grupos no
Congresso. Segundo ele, os fundamentalista "trabalham" para prejudicar
qualquer demanda relacionada à comunidade LGBT. "Eles não estão apenas
fazendo atuação parlamentar aqui, estão também nas redes sociais e na
internet atentos para qualquer matéria da comunidade LGBT fazendo
comentários odiosos, dos mais chocantes possíveis (...) é uma batalha
entre David e Golias, para usar a própria metáfora bíblica, contra uma
máquina eleitoral, com uma força política muito bem constituída, com um
projeto de poder muito claro", explica.
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